domingo, 9 de maio de 2021

pachamamas...

 

Eu nasci de cesariana. Para justificar a necessidade da cesariana, o médico disse à minha mãe que eu estava numa posição diferente no ventre dela, parecia que eu queria , ao invés de vir para fora, parecia que eu queria ir para dentro do coração de minha mãe. Mal sabia o médico que lá de dentro eu ouvia vozes muito estranhas, vozes de gente autoritária e cheia de ódio, vozes de censura e ameaça. Eram as vozes dos milicos da ditadura que dominavam o país àquela época. Querendo me afastar daquelas vozes falocráticas, fui cada vez mais em direção ao som do bater do coração de minha mãe, hino amoroso de Gaia e Pachamama, símbolos da Mãe-Terra. Eu queria ir para dentro do coração da Mãe-Terra e nascer dentro dela, pois ali os cultuadores da morte não alcançam.

Sócrates dizia que a filosofia é uma espécie de “maiêutica”. A palavra “maiêutica” significa : “arte de partejar e trazer ao mundo”. Em Sócrates, o parteiro é a razão. Que me perdoe o grande filósofo grego, mas nascem com mais amor à vida os que  são partejados pelo coração da Mãe-Terra, expressa na mãe pessoal de cada um.

Mas descobri que o coração não tem porta: aqueles que nos amam de verdade já nos carregam lá dentro do coração deles,  desde toda a eternidade, ensina Espinosa. Esse guardar no coração é a prática mais potente do cuidado com o outro de nós diferente, seja esse outro o  filho, o amigo ou simplesmente o outro cidadão, espelho da alteridade.

Os médicos tiveram dificuldades para me tirar lá de dentro de minha mãe...rs...Só aceitei sair quando consegui trazer o coração da Mãe-Terra comigo, para ser meu escudo para me proteger na luta contra os inimigos  da liberdade, do pensamento, da alegria, da arte, enfim, os inimigos da vida. Com esse escudo não se luta sozinho, sempre cabem muitos e muitas atrás dele, filhos e filhas da Mãe-Terra.

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