Segundo a mitologia, Hades é o deus
que habita a região escura muito abaixo da superfície da terra. Nesse lugar
nenhuma luz entra. Certa vez, porém, Hades ouviu risos vindo da superfície. Ele
subiu e viu Perséfone... Ela estava com sua mãe , a deusa Ceres. De “ceres” vem
“cereal”, pois Ceres é a divindade do plantio e colheita dos cereais. Ceres é
filha de Cronos, o Tempo, com Cibele, a deusa da fertilidade. E foi em sua neta
Perséfone que a fertilidade de Cibele se tornou uma força criativa semelhante
àquela que vemos no artista, pois Perséfone é a deusa cuja arte é fazer nascer
flores. Perséfone mata outra fome diferente daquela que Ceres mata: Perséfone
mata a fome de beleza, de poesia e de cores. Hades se apaixonou pelas flores e
quis levá-las para enfeitar sua noite eterna. Foi uma imensa surpresa, pois
ninguém imaginava que pudesse nascer no taciturno Hades um desejo por cores. Ele raptou então
Perséfone para fazê-la morar lá embaixo . Porém, naquele mundo carente de luz ,
de Perséfone nasciam rosas só com espinhos , sem as pétalas, flores da dor que
elas eram. Enquanto isso, sentindo a falta de Perséfone, Ceres ficou deserta :
o grão não mais germinava nela. Havia agora fome de pão e de beleza, de pão e
de poesia, e ninguém sabia qual das duas fomes doía mais: a primeira esvaziava
o estômago, a segunda ao coração secava . Zeus interveio e foi feito então um acordo.
Durante parte do ano Perséfone viveria lá embaixo com Hades : sua ausência
entre nós recebeu o nome de inverno. Até que vem o ansiado tempo em que
Perséfone sobe de volta e enche de vida
a terra : tudo recomeça , renovado.
Hoje, a treva não está somente lá embaixo,
treva pior nos ameaça aqui em
cima. Apesar disso, nada detém Perséfone: hoje, 22 de setembro, começa
a primavera, tempo em que Perséfone
chega para florir de vida a terra.
“O céu da teoria é cinza;
mas sempre verdejante é a árvore da
vida.” (Goethe)
- imagem: “O abraço amoroso de
Pachamama ( a Mãe-Terra )”/ de Frida Kahlo.
E ontem foi Dia da Árvore. As mentalidades obscurantistas sempre desprezam a natureza, já nos ensinava Espinosa. Esse desprezo é um sintoma de ódio à vida. Como homenagem às árvores tão ameaçadas, assim como os povos das florestas , um devir-árvore do poeta:
CANÇÃO DA PRIMAVERA / de Mário Quintana
Primavera cruza o rio
Cruza o sonho que tu sonhas.
Na cidade adormecida
Primavera vem chegando.
Catavento enlouqueceu,
Ficou girando, girando.
Em torno do catavento
Dancemos todos em bando.
Dancemos todos, dancemos,
Amadas, Mortos, Amigos,
Dancemos todos até
Não mais saber-se o motivo…
Até que as paineiras tenham
Por sobre os muros florido!
Nenhum comentário:
Postar um comentário