quinta-feira, 24 de setembro de 2020

eros, psiquê, pneuma

 

Em grego, há vários nomes para a “alma”. O mais original  deles é “Psiquê”. Não por acaso, na mitologia  Psiquê era o nome próprio de uma jovem. Diferentemente do termo  “Razão”, princípio masculino , Psiquê não é o nome  de apenas uma parte da alma, mas da alma inteira. Psiquê não era somente   raciocínio e teoria. Ela era isso também e mais sensibilidade, intensidade, beleza , generosidade , coragem, coração e poesia. Enquanto a Razão tem a pretensão de  existir e pensar sozinha ( exemplos disso são o  racionalista Descartes,  com o seu ensimesmado “Penso, logo existo”, e o rígido  Kant  com sua “Razão Pura”) , Psiquê só se viu inteira quando encontrou sua companhia. A companhia de Psiquê é Eros, o Amor. Esta palavra é a reunião da partícula “a” com função privativa ( como em “a-fasia”, “não fala”) mais a abreviação da palavra  morte ( “mor”). Assim, no seu sentido original, “amor” é “não morte” ( nos vários sentidos que a morte pode ter). Quando lutamos  pela não morte das florestas, pela não morte dos povos originários, pela não morte da educação, enfim, pela não morte de nós mesmos enquanto sociedade plural e heterogênea, lutamos  mais fortes se o amor também nos fizer companhia. É na companhia de Eros , agenciada com ele, que Psiquê resiste à morte; e  é na companhia de Psiquê que Eros aprende que ele mesmo não sabe tudo o que pode.

A  “alma” possui ainda  outro nome: “Pneuma”. Esta palavra costuma ser traduzida por “sopro”. Em latim, “spiritus”. Porém  pneuma, ou spiritus, não é  o sopro  que a gente expira  ( quando colocamos o ar para fora). Pois pneuma designa o ar  que a gente inspira, puxando o ar para dentro de nós . Quando a gente expira, é a gente que sopra; mas quando a gente inspira é a própria  vida  que sopra  dentro de nós. Quando o bebê sai do ventre e nasce,   o ato que inaugura seu respirar é o inspirar  que o desperta para a vida. Esse inspirar inaugural não é feito apenas pelo seu pequenino pulmão, mas por todo seu corpo. Este é o sentido original de “inspiração”: “encher-se de vida para intensificar a vida que vive em nós”, para assim não sufocarmos. Na verdade, a tradução mais correta de “pneuma” não é “sopro”, e sim “brisa úmida”, como aquela que , vinda do oceano, ao deserto vivifica.

 

"Por toda parte , estremecendo, sentimos o mesmo  Sopro gigantesco que, escravizado, luta por libertar-se." ( Nikos Kazantzákis)






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