domingo, 15 de janeiro de 2023

massa, povo e multitudo

 

1- Em razão dos episódios hediondos do último domingo, está sendo muito lembrado o texto de Freud “Psicologia das massas e análise do eu”.

Segundo Freud, a massa anula a personalidade dos indivíduos que entram nela, ao mesmo tempo desfazendo nesses indivíduos mecanismos psicológicos que freiam a subida à mente  de impulsos associais destrutivos. Na massa esses impulsos circulam e amalgamam  cada indivíduo , desumanizando-os.

Cada indivíduo tem um nome, porém a massa é anônima: fazendo parte dela, cada indivíduo perde criminosamente a noção de responsabilidade  por seus atos, uma vez que quem age é a massa : na massa  são  reveladas as sombrias faces ocultas   que se escondem atrás do rosto do  chamado “homem de bem...”

Sob o poder da  massa, pequenas antipatias se tornam ódios mortais , enquanto  seus líderes são tratados como  seres divinizados cujas mensagens se tornam palavras de ordem a serem repetidas e obedecidas  fanaticamente.

Segue um trecho de Freud: “As massas nunca tiveram a sede da verdade. Requerem ilusões(...). Nelas o irreal tem primazia sobre o real.”


2- Acrescentando ao que diz Freud, trago Espinosa. Não são a mesma coisa as ideias de “massa”, “povo” e o que Espinosa chama de “multitudo”.

As massas são instrumentos passivos de “líderes” que as fomentam e as mantêm arrebanhadas  canalizando a seu favor , e contra seus inimigos ( reais ou imaginários),  impulsos como o ódio ,  o medo , a violência e a obediência cega, servil.

Já o povo é um conceito jurídico-político. O povo não tem um líder que o submete e arrebanha; ao contrário,  o povo escolhe seus líderes mediante preferências  eleitorais democráticas. É verdade que “todo poder emana do povo”, porém povo não é massa.   

A palavra “multitudo” tem por sinônimo “multiplicidade”. Multiplicidade é tudo aquilo que potencializa e torna múltipla a singularidade que dela faz parte.

A multiplicidade não tolhe, ela multiplica; ela não destrói, ela cria; ela não odeia, ela ama a si própria e por isso se  indigna contra as tiranias; ela não escolhe líderes, ela afirma a si mesma como soberana.

A multitudo não é massa anônima que dissolve os eus na irresponsabilidade insana, a multitudo é a expressão de um “nós” ético-político enquanto agenciamento plural de singularidades não egoicas .

Ao contrário de uma nação , a  multitudo não habita apenas um país, ela habita a Terra, embora seja sempre num país, numa cidade ,ou mesmo num bairro, que ela se manifesta.

E onde a multitudo se manifesta, neste espaço também se expressam as questões sem fronteiras determinadas que concernem à humanidade inteira em seu avançar educacional-democrático-civilizatório.




 

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