“Ancestral” não significa aquilo que
está no passado e passou. Ancestral significa: “o que já estava aqui”, e que
deve dar sentido ao nosso aqui e agora construtor do amanhã.
O ancestral já estava aqui e continua
existindo naquilo que nasceu dele: a
semente é a ancestral da árvore, a fonte é a ancestral do rio, a criança é a ancestral do adulto. Não existiriam
árvore, rio e adulto se não existissem semente , fonte e criança.
A ancestralidade da semente se renova no fruto
que a árvore gera, a ancestralidade da fonte revive na sede que a água do rio
mata, a ancestralidade da criança renasce em cada criança nova que vem ao mundo
( seja a criança literal , seja o devir-criança que o poeta reinventa em seus
versos).
Os povos da Europa não são nossos ancestrais, nossos ancestrais são os povos originários
que já estavam aqui e que aqui continuam : no nosso corpo, na nossa cultura ,
na nossa linguagem .
Na raiz da palavra “genocídio” está a palavra “gens”.
Dessa palavra também vêm “gente” e “gênese”. O genocídio é um crime contra
gentes . No caso do Brasil atual , o genocídio contra os indígenas é um crime
contra nossa ancestralidade, contra nossa gênese.
Nesse momento, só na Amazônia há mais
de 100 grupos teológicos-políticos cúmplices do miliciano tentando
“evangelizar” à força os povos da floresta. “Genocídio” é quando um povo
extermina com violência física (
incluindo a violência da fome e das
doenças) a existência de outro povo. Mas
quando exploradores teomilicianos tentam
roubar a alma do outro povo para engordar rebanhos e explorar dízimos, essa violência na alma se chama “etnocídio”.
O miliciano e seus cúmplices pregam :"Os indígenas querem viver como
nós". E a voz ancestral que vive em
nós se indigna e pergunta: “ 'Nós' quem, cara-pálida?"
Muitos brasileiros têm antepassados
na Europa, e assim buscam a dupla nacionalidade. Mas o Brasil enquanto Mátria
tem nos povos originários a sua ancestralidade. Nenhum povo tem dupla
ancestralidade, pois a ancestralidade é sempre única e primeira: a
ancestralidade tem primazia sobre a ideia de pátria e nacionalidade.
O miliciano costumava dizer que “as
minorias devem se submeter à maioria”. Para justificar seus impulsos genocidas,
ele colocava os povos originários como minoria. Mas nossos povos originários não são minoria, eles estão na nossa gênese e
no nosso valor enquanto gente.
Por isso, o genocídio não é só contra
os povos originários, ele também é contra a gente enquanto parte da humanidade em contraposição à barbárie . É
como um criminoso contra a humanidade que o genocida deve ser
denunciado.
( parte do escrevi se inspira
neste novo e necessário livro de Krenak)
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