Os filósofos Deleuze e Guattari diferenciam “múltiplo” de “multiplicidade”.
Ambas as ideias podem ser expressas numa fórmula. A fórmula do múltiplo é “n +
1”, já a fórmula da multiplicidade é “n -1”.
Nessas fórmulas, a letra “n” significa uma quantidade que não
pode ser determinada por um número fixo ou exato, já o número “1” simboliza a
ideia de “unidade”. Assim, muitas coisas aparentemente são múltiplas , porém
pode ocorrer de uma instância se colocar
acima delas como detentora do
poder sobre elas, isto é, como o “1” querendo-se superior .
Os rebanhos de toda espécie , por
exemplo, têm múltiplos elementos, porém um “pastor” ( no sentido literal ou
figurado) os governa impondo-lhes
"Uma" verdade. E assim nascem os dogmas, as “cartilhas”, bem como as
perseguições paranoicas aos “hereges”.
Já a multiplicidade é “n-1”: ela é diversidade
aberta que impede que se descole dela, querendo pôr-se acima, algum elemento dela com a pretensão de ser o
1. O sinal de menos expressa que a multiplicidade nunca se
subtrai a si própria.
Na fórmula “n+ 1”, o “1” é o poder e “n” é o múltiplo governado por esse poder, ao passo que “n -1”
expressa a multiplicidade como
potência autogovernada e em expansão, afirmando-se.
A democracia representativa pode , às
vezes, ficar sob o risco de certo “n+1”
fascista , no qual o “1” é o discurso autoritário de tiranos que
negam a democracia e sua pluralidade , tal como se vê na palavra de ordem autoritária: “Pátria
, Deus e Propriedade acima de todos”.
Mas a democracia enquanto potência da própria
vida é sempre “n -1”. Espinosa chamava
essa democracia de “multitudo”, Deleuze e Guattari a nomeiam “rizoma” : a
“utopia imanente”.
(imagem: na ruas do Chile,
enquanto parte da multitudo , a
bailarina salta para afirmar a arte contra a barbárie do "1" que reprime o "n" da
multiplicidade enquanto diferença agenciada. A própria bailarina deu um nome ao seu salto: "O
despertar" . Que esse despertar nos inspire a acordar , enfim, do pesadelo
que nos sufoca desde o golpe de 2016...)
- da trilha sonora do filme "Mariguella":
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