quinta-feira, 1 de julho de 2021

os filósofos e os livros

 

Quando Sócrates foi preso, os policiais rumaram à casa do filósofo para apreender seus supostos  “livros subversivos” , que os policiais  supunham muitos. Na  casa , porém , não viram nenhum livro, encontraram apenas a esposa do filósofo tentando esconder o choro diante dos filhos que, parando de brincar, indagaram aos  policiais: “Cadê meu pai!?”

Plotino quase não tinha livros em casa, embora fosse considerado o homem mais sábio  de sua época. Mas  seu lar era cheio de gente, inclusive crianças órfãs, as quais Plotino cuidava e alimentava , antes de ir   contemplar com amor  o céu.

Assim que Espinosa morreu, seus perseguidores  invadiram o quarto do filósofo, imaginando que ali havia mil livros “perigosos”  que Espinosa escreveu em parceria com o Diabo. Armados com tochas , queriam tacar fogo nos livros do filósofo. Mas  no quarto modesto, que Espinosa alugava na casa de uma família  simples, os fanáticos  do poder teológico-político encontraram apenas pouco mais de 100 livros, todos com sinais de que foram muito lidos, embora bem cuidados. Havia não só livros de filosofia e ciência, havia também livros de poesia. No centro da prateleira, aberto, encontrava-se  o livro “Sobre a Natureza”,  escrito pelo  poeta-filósofo Lucrécio, que dizia que o pior escravo é  o servo voluntário da superstição negadora do conhecimento.

Todo dia, no meio da tarde, Kant deixava sua biblioteca para ir deambular pelas ruas e praças de sua cidade. Como um dedicado aluno, Kant caminhava observando atentamente tudo, para aprender diretamente lendo o livro do mundo.

Certa vez, Wittgenstein rompeu com os livros, não queria mais saber de filosofia ; mergulhou numa angústia profunda, parou de ensinar. Quem o resgatou para o pensar foram as flores de um jardim que ele começou a cuidar. O filósofo redescobriu-se filósofo sendo jardineiro. Renovado, voltou a ensinar:   tornou-se professor de um jardim de infância para crianças pobres.

 

( imagem: “Sherazade”, obra-instalação de Sami Hilal  . Como a personagem feminina de “As mil e uma noites”,  que vence  com sua arte o misógino e autoritário “Sultão”, os livros se agenciam formando um fluxo que acha caminhos para seguir em frente. Acrescentei os versos de Manoel)






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