Sempre que se pensa em mitologia,
surgem os nomes de Homero e Hesíodo. Mas
esses poetas eram referências eruditas cultuadas pela aristocracia. Aliás,
Homero e Hesíodo não criaram os mitos, eles apenas os relataram por escrito, e
não foram os únicos a fazerem isso. Porém
o mito enquanto relato oral que dava sentido às práticas , quem mantinha
os mitos assim vivos e imanentes à vida concreta eram as mulheres. Mães, amas de leite (
equivalentes às nossas “mães pretas”),
poetas, educadoras...eram elas que , pela palavra falada ,inseriam o mito na
vida, retirando o mito da alma e do corpo delas, como poesia que se vive e recria. Essas mulheres não eram
exatamente anônimas, elas eram “pessoas coletivas”. Esse termo, “pessoa
coletiva”, é como o pensador indígena
Krenak se refere aos poetas da tribo. Mas um nome dessas “contadoras de
história” é conhecido: Diotima, a sábia que Platão cita ao recontar um mito que
ouvira da boca dela. Essas contadores de histórias também eram professoras,
poetas , pensadoras, filósofas. E era com elas que a poesia se tornava a base
efetiva da educação grega, a Paideia.
Quando o racionalismo falocrático
triunfou na Grécia, houve uma perseguição à
poesia e à mitologia como base da Paideia. Mas a motivação dessa perseguição também era política :
reprimir e calar o feminino, ou o
devir-feminino, enquanto produção de
sentido não patriarcal e macho-centrado.
A Grécia também teve seus “Sultões”,
como aquele que quis calar Sherazade. Mas Sherazade não se calou e produziu sua “linha de fuga”
poético-libertária ,e é nessa linha que também devemos segurar para produzir agenciados a nossa liberdade,
com pensamento, afeto, ação e poesia.
( imagem: capa do belo livro “O amanhã não
está à venda”/ de Krenak)
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