Há um poema de
Fernando Pessoa no qual ele nos ensina o que é preciso fazermos para “sermos
grandes”.
Segundo o poeta,
para sermos grandes de verdade não precisamos comprar ou acumular coisas,
tampouco ambicionar ser o primeiro lugar em pódios
O poeta diz mais
ou menos o seguinte: “Para sermos grandes , devemos fazer como a lua que nunca
se recusa a refletir-se inteira na mais simples poça do caminho”.
A lua é grande porque ela não rejeita a poça
julgando-a indigna de receber sua presença: ao contrário, é a presença da lua
na poça que dignifica a poça. A lua engrandece a poça sem ser diminuída.
A lua não se
reflete pela metade ou em parte na poça, ela se coloca por inteiro, nos
ensinando o que é ser íntegra.
Não é o tamanho daquilo no qual ela se reflete
que faz a grandeza da lua, é a grandeza da lua que engrandece a realidade na
qual ela se reflete.
A primeira vez
que li esse poema foi numa aula de filosofia no antigo segundo grau.
A palavra
“afeto” significa: “ser tocado”. Nem tudo que nos toca de imediato e
potentemente a gente consegue compreender intelectualmente na hora. E foi assim
que fiquei após a leitura: preenchido, mas sem saber pelo quê.
A querida professora que apresentou o poema
disse que o sentido dele levaria tempo para se compreender, e que eu
o compreenderia quando dentro de
minha mente houvesse um clarão. Poemas assim a gente lê para ler-se.
Já era noite
quando saí do colégio . Caíra uma tempestade durante a tarde . No asfalto , aqui e ali , poças que a chuva deixou.
Eu caminhava de
cabeça baixa : me pesavam, como chumbo,
as decisões que urgentemente eu
precisava tomar . O vestibular se aproximava , eu queria fazer filosofia, mas havia o perigo que significava fazer
filosofia numa época de chumbo ainda
sob ditadura militar; também me
preocupava como eu sobreviveria
materialmente com filosofia, eu era de
família pobre, sem recursos.
Eu
caminhava olhando para o chão, com a
cabeça tomada pelo peso dos
problemas, ao mesmo tempo pensando no poema.
De repente, vi numa poça d’água a lua : era uma lua cheia indescritível,
intensamente iluminada, linda...
A lua conseguiu
abrir uma brecha entre as nuvens de chumbo
que ainda cobriam o céu. E de lá do alto ela me alcançou empregando como meio uma simples
poça no chão . Às vezes, realidades elevadas nos alcançam usando como meio as
coisas mais inesperadas...
Quando vi a lua
refletida na poça, de imediato ergui a cabeça e os olhos em sua direção , vencendo o peso que mantinha meu
pensamento aprisionado no chão.
A lua horizontava a poça , a transformava num
oceano de descobertas e a fazia de
trampolim para meus olhos se alçarem, empoemados.
E foi com os
olhos assim que vislumbrei , apesar da
noite, o caminho que eu deveria seguir, pois por dentro me iluminou um clarão.
Hoje, as redes
digitais acefalizantes, como as instrumentalizadas pelo Musk, “abduzem” as
mentes incautas levando-as a visões de mundo servis. O corpo dessas
pessoas está aqui, porém a mente delas é abduzida pelo tecnopoder
algoritmizado que as ausentifica da vida, apequenando-as. Sobre a “abdução” das mentes pelo uso irrefletido
das tecnologias digitais, este livro é uma boa referência ( sobretudo os
capítulos “Smartphones”, “Selfies” e “Inteligência artificial”).
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