sábado, 24 de agosto de 2024

O cacto

Muito se fala, com razão, das flores. Girassóis, crisântemos, margaridas...Essas e outras flores já foram homenageadas em poemas , músicas e pinturas. Flores também são empregadas como símbolos: o lírio é símbolo da pureza e Iluminação; a rosa vermelha, das revoluções igualitárias.

Mas pouco se fala das flores que o cacto também sabe produzir. Considero essa omissão  uma injustiça com esse artista da resistência. Na dele, sem chamar a atenção ou fazer propaganda de si, o cacto é capaz de atos que expressam  rara beleza e simbolizam  generosidade.

Assim age esse perseverante resistente: o cacto é a planta que possui a maior raiz. Em alguns cactos,  a extensão de sua raiz chega a nove ou dez vezes o tamanho do corpo do cacto que vemos à superfície do chão!

Quem mede o cacto apenas pela sua parte visível, e pensa que a parte que vê é todo o ser do cacto, por certo ignora o que o cacto é capaz de fazer. O cacto cria imensas raízes para sondar o subsolo , não se deixando vencer pela aridez que o cerca. As raízes do cacto tateiam procurando veios d’água metros abaixo da paisagem seca. Ele persevera procurando no coração da Mãe Terra a água que o Céu lhe nega.

Quando encontra a água, o cacto anuncia sua descoberta brotando flores: em pleno árido , ele inaugura uma primavera. Então, ele sorve o líquido e se intumesce , de água fresca ficando grávido. Basta um pequeno furo para a água jorrar matando a sede dos necessitados.

Foram os cactos do sertão nordestino que, no passado, não deixaram morrer de sede a rebeldia de Lampião e seu cangaço ; e a flor que Maria Bonita punha no cabelo também floresceu de um cacto : o mandacaru, símbolo da força do povo nordestino.

O cacto mandacaru expressa a resistência da vida, uma resistência que também se faz com poesia e beleza, apesar da aridez que a cerca. O mandacaru matou a sede de Lampião e deixou a Maria ainda mais Bonita.

Como ensina o grande poeta nordestino: “Quando não pode ser cristal, a poesia vale pelo que tem de cacto.”(João Cabral de Melo Neto)

( e como vimos recentemente na  passagem do inelegível pelo Nordeste, talvez seja  o néctar produzido pela flor do cacto  o alimento  antiautoritário que  nutre as    abelhas nordestinas e as enche de coragem para aferroar e expulsar  os antidemocráticos...)

 



 

 

Uma parceria de Tom Zé, Arnaldo Antunes & Grupo Corpo ( o nome da música é "Xique-xique", um cacto do sertão nordestino) :



  

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