“Nômade” vem de “nomos”. “Nomos” também está presente em “auto-nomia”:
“governar a si mesmo”. Pois este é o sentido original de “nomos”: “governar-se”
, individual ou coletivamente.
O oposto de “nomos” é o poder autoritário que violenta e tiraniza. Na
mitologia, Nomos era um Daimon. O Daimon não habita o Oceano ( Poseidon) , o
Subsolo ( Hades) ou o Céu (Zeus). O Daimon habita espaços de travessias sobre
Gaia, a Mãe-Terra.
O Daimon-Nomos expressa a necessária travessia da injustiça à justiça, do
cativeiro à liberdade, da passividade à ação, da tristeza à alegria, como
ensina Espinosa em sua política.
O Nomos andava junto de outro Daimon: Diké. Em latim, Diké é Dictio,
“Dizer”. Essa palavra está na raiz de “jurisdictio” ou “jurisdição”: “dizer o
que é justo”. Não é o juiz o titular da Diké. A Diké é um dizer coletivo,
social, e nunca a voz de um só, por maior que seja o poder desse um só.
A voz da tevê , a voz da mídia não são Diké. Nem a voz do congresso é
Diké ( muito menos a voz dos juízes togados...).Diké é voz de um “demos” , como
origem da “democracia”. Diké é voz da rua, voz essa que soa mais forte quando
aprende a dizê-la aqueles aos quais o
poder quer calar.
Não por acaso, em grego “felicidade” se escreve “eudaimonia” : “estar na
companhia de um bom Daimon”. Para o grego, assim como para os nossos povos
originários, não existe felicidade apenas privada ou sozinha, pois felicidade é
travessia agenciada por uma voz que luta por felicidade coletiva.
Diké é mais do que voz jurídica , pois ela também pode ser dizer poético que Manoel de Barros, em versos,
ensina: “Poesia pode ser que seja fazer outro mundo”.
Quando a lei corre riscos de virar
instrumento do poder ganancioso e depredador dos “homens brancos” , ameaçando a
existência da natureza e dos povos, o
Nomos precisa ganhar voz e se tornar Diké Originária: voz que , unindo a cidade
às aldeias, clama por justiça dos povos originários.
Não ao Marco temporal!
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