Assim nasceram as artes: Zeus , a
divindade que simboliza a ética e a justiça, venceu em luta as forças da
barbárie. Porém, Zeus percebeu que não bastava vencer as forças da barbárie naquele presente apenas , era preciso criar
uma memória de que se é possível
vencê-las novamente, pois há sempre o risco dessas forças da barbárie retornarem de seus bueiros e trevas, reaparecendo
disfarçadas com outros nomes, em outros
tempos históricos ( como reapareceram na
Itália fascista, na Alemanha nazista, nas ditaduras militares da América Latina e suas versões
milicianas... ).
Então, Zeus esposou Mnemosyne, a
divindade que simboliza a memória. Zeus queria, agenciado com Mnemosyne, criar uma memória da ética , uma ética da
memória, para assim co-memorar , criar memória, de que se é possível vencer a
barbárie . Desse amor entre a ética e a memória nasceram então as nove Musas,
cada uma simbolizando uma arte. “Musa” significa: “conhecimento por intermédio
das artes”, isto é, um conhecimento que nasce quando se desperta a
sensibilidade à ética, à justiça, ao conhecimento, à criatividade e à coragem.
Pois arte não é distração ou passatempo, arte é a expressão de uma vitória da
potência libertária sobre as forças da barbárie. Arte é educação, incluindo a
educação política. Uma das Musas se chamava “Clio”, e simbolizava a História.
Pois a História existe como arte a serviço do não esquecimento do passado.
Quanto mais um povo esquece seu passado, ou não o compreende, mais as forças da
barbárie tiram proveito dessa ignorância e reaparecem como se fossem uma “moral
” , “religião” ou “política” novas. Mas
se a gente raspar as máscaras sob as quais se escondem esses aproveitadores,
veremos o mesmo velho e sinistro rosto sujo de sangue dos que ,ao longo da
história, ameaçaram de morte a ética, as
artes, o conhecimento, a liberdade, a educação, enfim, a vida.
O lugar no qual as Musas habitam se chama “Museu”. Um autêntico Museu,
portanto, nada tem a ver com um depósito de coisas mortas . Um autêntico Museu guarda, protege e co-memora as lutas travadas no
passado, lutas essas que hoje devem nos inspirar para as urgentes lutas do presente. São lutas assim que guarda
o Museu da Maré ( onde vive o acervo da luta de Marielle) e o Museu Histórico de
Bacurau, museu-arquetípico de um Brasil que é muito maior do que o “brazil militarista-miliciano” cultuador de armas. No Museu Histórico de Bacurau ainda
vivem Zumbi, Dandara, Virgulino, Carolina de Jesus, Lima Barreto, Glauber, Cartola,
Luísa Mahin...Pois o principal patrimônio desse Museu não é o passado, e sim
um futuro que ainda nem nasceu. Um futuro buscado por aqueles que por ele lutaram
, e que devem nos inspirar na luta
presente contra as forças obscurantistas que nos ameaçam com o
retorno de um passado de tortura, censura e medo.
“A arte não é um espelho do mundo,
mas um martelo para forjá-lo”. (Maiakovski)
“Poesia pode ser que seja fazer outro
mundo”. (Manoel de Barros)
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