Segundo a matemática, um triângulo
possui três pontos singulares ( também chamados de “pontos extraordinários”) e
uma quantidade indefinida de pontos regulares ou “ordinários”. Os pontos singulares do
triângulo são aqueles que ocupam os três vértices, ao passo que os pontos
ordinários são os que estão nos lados do triângulo. Já um quadrado possui
quatro pontos singulares e uma quantidade indefinida de pontos ordinários em
seus quatro lados. Uma linha reta possui dois pontos singulares: os que estão
no início e no fim da linha, entre os quais se encontra uma quantidade
indefinida de pontos ordinários. Os
pontos singulares/extraordinários são aqueles nos quais se expressa uma
diferença , enquanto os pontos ordinários se comportam como uma massa
indistinta e homogênea, como um rebanho. E o círculo, quantos pontos
singulares/ordinários ele possui? À primeira vista, parece que o círculo é
destituído de pontos singulares, refém ele parece ser de pontos ordinários apenas . Costuma-se comparar nossa
vida a um círculo: “o círculo da vida”. Estaria então nossa vida refém da
ordinariedade? Será que o rebanho vence a singularidade? O ordinário tem mais
poder que o extraordinário? Mas o círculo guarda um segredo, tanto na
matemática quanto na vida: qualquer ponto dele pode se metamorfosear em ponto
singular/extraordinário, desde que por ele passe uma tangente. “Tangente” significa: “o que toca e afeta”.
Como diz o poeta Manoel de Barros, uma tangente é o que “nos desabre”. Tangente
é o que vem de fora, como um sopro de coisa nova e inesperada que fende o
círculo estreito das verdades fechadas. Numa tangente , o ponto pertencerá, ao
mesmo tempo, ao círculo e à linha que vem de fora. Tangente também pode ser uma ideia libertária
que desfaz o círculo no qual se fechava, crendo-se derrotada, a nossa mente. Tangente
também pode ser a poesia que abre a palavra acostumada e nela põe sentido novo. A
própria vida surgiu em nosso planeta como uma tangente que abriu o círculo
opaco da matéria, e nela pôs olhos , ouvidos e bocas como abertura ao mundo.
Uma tangente é como o fio de Ariadne: fende o círculo de morte dos labirintos
onde a inação nos prende. Sem dúvida, não é fácil vencer a ordinariedade e seus
rebanhos. Porém não se pode esquecer que, enquanto houver vida e história
humana, as tangentes sempre emergem com sua força renovadora e fendem o círculo
do mesmo para fazer entrar um pouco de
ar de fora. Mas as tangentes não existem prontas, elas não caem do céu. Na
maioria das vezes, somos nós mesmos que precisamos criar nossas próprias tangentes, e isso não se faz sem luta. Toda tangente faz o círculo da vida e da história saírem da
imobilidade e girarem para o lado certo, para assim avançarmos.
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