sábado, 18 de abril de 2020

o monturo


No poema “O guardador de águas”, o poeta Manoel de Barros descreve o seguinte acontecimento: sob um monturo de restos de folhas que já foram árvore, de cacos de vidro que já foram garrafas de vinho e de farrapos de roupa que já foram vestes de festa , sob tal monturo que a natureza recolheu sem lamentar-se pelo que já foi e passou, no ventre desse casulo úmido , dentro do monturo, uma semente que ali estava sufocada despertou: libertou-se dela um broto, como se fosse um dedo, depois um caule, como se fosse um braço, por fim uma folha como mão escavando. Uma linha de fuga foi-se desenhando, na força de uma vida nova a furar o passado de coisas mortas. Inventando uma saída, uma porta, nasceu do monturo um lírio.

"Poeta é ser que vê semente germinar" (Manoel de Barros)





- a fala da Bethânia é um trecho deste belo filme/homenagem feito pelo Gabraz Sanna ( o filme está inteiro no youtube):

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