quinta-feira, 16 de abril de 2020

ao mestre



Dia desses, numa manhã muita bonita, vi passar um senhor bem idoso, porém firme e altivo. Ele tinha os cabelos muito brancos, como neve a adornar altos picos. Aliás, creio que apenas em homens elevados, e que auxiliam os outros a se elevarem, deveria nascer tal cobertura branca.
Vê-lo fez reviver dentro de mim uma palavra que há muito eu não dizia. Foi a “potência-alegria” de que fala Espinosa o que senti ao saber que tal palavra ainda em mim vivia à espera de reencontrar aquele a quem ela designa e nomeia. Essa palavra não estava escrita no meu cérebro onde se acumulam teorias, ela estava guardada em meu coração ,lugar do Afeto, junto à lembrança dos seres que conheci e que me tornaram o que sou. Foi então do coração que a palavra veio subindo, já com pleno sentido, embora ainda sem se vestir com o som. Quando ela chegou à minha boca, tornou-se voz e chamou: “Mestre!!!”. Aquele senhor era um querido professor que tive há muito tempo. Ele me reconheceu , sorriu e estendeu a mão para mim, encontrando a minha que já lhe estava estendida desde a primeira aula dele que assisti . Não sei ao certo quanto tempo conversamos, o durar do afeto não o mede relógios. Quando nos despedimos, fiquei parado vendo-o ir, e pensei: "Será que ele sabe o quanto foi importante em minha vida?”
“O aprender vem antes do ensinar”, dizia Deleuze. O autêntico professor gosta de ensinar porque, antes, amou aprender com aquele que lhe ensinou lições que não estão apenas em livros. Creio que nos tornamos professores quando o mestre que nos fez mestre não vive apenas fora, ele passa a viver dentro da gente, e com ele continuamos a aprender mesmo enquanto ensinamos. Assim, apenas sob certa perspectiva aquele meu antigo mestre se afastava de mim depois que nos despedimos naquela manhã ensolarada, pois sob outra perspectiva ele nunca de mim saiu desde que , com suas aulas, em minha vida entrou . Quanto mais o tempo passa mais se aviva em nós o que tem valor e mereceu ser aprendido .
O nome do inesquecível mestre: Luiz Alfredo Garcia-Roza.

( escrevi este texto há cerca de dois anos ao encontrar o querido mestre . Hoje , dia 16/04/2020, a dor nos pegou:o mestre nos deixou...Porém ele permanecerá em suas obras e na vida de muitos que ele cativou e potencializou. Minha eterna gratidão, mestre!)







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