terça-feira, 16 de abril de 2019

manoel e o antesmente verbal


Manoel diz que a poesia está no “antesmente verbal”. O verbal é a palavra , escrita ou falada. A poesia está antes da palavra, mas não como o esboço que está antes do quadro . Quando o pintor termina a obra, o esboço se torna algo dado: o quadro. Neste, o esboço deixa de existir. O antesmente onde vive o poético não é semelhante ao que vem antes do que está dado e que logo fará parte do mundo dado, como o esboço que se torna quadro e assim morre. O antesmente poético nunca será dado, a não ser como sentido inventado que subverte o significado do que está dado. Nenhum verbal esgota o antesmente verbal e o faz deixar de existir. O antesmente não é o verbal ou a palavra, mas também não é ideia pronta já pensada. Essa realidade antesmente verbal só pode ser conhecida se experimentada, desde que aquele que a experimenta também se coloque antesmente em relação ao que sabe e a tudo o que parece definitivamente pronto e acabado, para assim devir outro, pondo-se antesmente a si mesmo, mas na imanência do mundo, da vida e daquilo que ainda não tem nome: “As coisas sem nome são mais ditas pelas crianças” ( Manoel de Barros). Antes de estar na palavra, o sentido está nesse antesmente, mais como parte de mundos a criar do que como parte de livros já lidos. Lá, o sentido não está escrito ou dito, lá ele só pode ser pensado e sentido, tal como o embrião de uma vida nova.





Manoel de Barros se formou em Direito. No entanto, seu primeiro cliente foi também o último. Tratava-se de um peixeiro  que foi acusado de desonestidade no uso da balança : na hora de pesar a mercadoria, sorrateiramente ele apoiava o dedo para aumentar o peso de forma fraudulenta. Uma senhora viu e acusou o peixeiro, abrindo um processo contra ele. Era a palavra do peixeiro contra a da senhora que o acusava, pois não havia outra testemunha, embora a fama do peixeiro não fosse boa. Manoel pediu para conversar a sós com o peixeiro, e perguntou: “É verdade o que ela diz? Você burlou o peso?” E o peixeiro respondeu: “É verdade.” Manoel pediu imediatamente licença ao peixeiro e foi conversar com o dono do escritório de advocacia, dizendo: "Desisto do caso, não vou defender esse homem: não é esse tipo de  falsidade e mentira   a invenção de que gosto”.

Nenhum comentário: