segunda-feira, 15 de outubro de 2018

o encontro com o mestre


Dia desses, numa manhã muita bonita, vi passar um senhor bem idoso, porém firme e altivo.  Vê-lo fez reviver dentro de mim uma palavra que há muito  eu não  dizia. Foi a “potência-alegria” de que fala Espinosa o que senti ao saber   que tal palavra  ainda em mim  vivia , à espera  de reencontrar aquele a quem ela designa e nomeia. Essa palavra não estava escrita no meu cérebro onde se acumulam teorias, ela  estava guardada em meu coração ,lugar do Afeto,  junto à lembrança dos seres que conheci e que me tornaram o que sou. Foi então do coração que a palavra veio subindo, já com pleno sentido, embora ainda sem se vestir com o som. Quando ela chegou à minha boca, tornou-se voz e chamou: “Mestre!!!”.  Aquele senhor era um querido  professor que tive há muito tempo. Ele me reconheceu , sorriu e estendeu a mão para  mim, encontrando  a minha que já lhe estava estendida  desde a primeira aula dele que assisti .  Não sei ao certo quanto tempo conversamos, o durar do afeto não o mede relógios. Quando nos despedimos, fiquei parado vendo-o ir, e pensei: ”Será que ele sabe o quanto foi importante em minha vida?” Antes de ele ir, olhei  seu rosto e tive a impressão de que ele também estava a   recordar-se do mestre que teve e que o inspirou a ser mestre, e por isso ele entendia minha gratidão. E esse outro mestre do mestre, se vivo estiver, também deve estar se lembrando, hoje,  daquele que o fez mestre. Pois hoje é dia não exatamente de nos lembrarmos de nós mesmos , mas daqueles que nos fizeram ser o que somos, professores. É sempre o aprender que vem primeiro. O autêntico professor gosta de ensinar porque, antes, amou aprender com aquele que lhe ensinou  lições que não  estão apenas  em livros. Creio  que nos tornamos professores quando o mestre que nos fez mestre não vive  apenas fora, ele passa a viver  dentro da gente, e com ele continuamos a aprender mesmo  enquanto ensinamos. Assim,  apenas  sob certa perspectiva aquele meu antigo mestre se afastava de mim,  sob outra perspectiva ele nunca de mim saiu  desde que , com suas aulas, em minha vida entrou , passando a viver na companhia de  outros queridos  mestres que igualmente entraram  em mim e me tornaram o que sou : a  Professora Nadir ( minha primeira professora de filosofia e quem me libertou), o  inesquecível Cláudio Ulpiano, o generoso Luiz Alfredo Garcia-Roza , o grande Gerd Bornheim e o sábio   Junito Brandão : “O melhor de mim sou Eles”(Manoel de Barros)











(Como minha querida Professora Nadir não escreveu livros, posto esta imagem que me fez lembrar dela  , com o trecho de um poema de seu poeta preferido. Na foto,  Stheffany Rafaela, moradora de uma comunidade do Recife, que transforma em sala de aula as vielas de sua comunidade. Foto: Aldo Carneiro/Pernambuco Press).

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