sábado, 8 de setembro de 2018

a bomba e o novelo


O ódio é como a chama que vai devorando um pavio. Ele não cessa de destruir o que o mantém vivo, exatamente o fio. O ódio só para quando atinge a bomba. Talvez vivamos a época em que há uma bomba no meio de um pavio que se estende à direita e à esquerda da bomba. As duas extremidades do pavio estão acesas, e cada extremo vai consumindo seu pavio com o fito de ameaçar o outro extremo. O encontro desses extremos odiantes coincide com a vitória da bomba.
O afeto que afirma a vida não é como o fio do pavio, talvez se assemelhe ao fio que sai de um novelo , e se oferece como linha de fuga aos que estão em perigo, perdidos. Expandir o novelo através de si, criando conexões e bordaduras , é essa a maneira que a vida tem de resistir.
O fio do pavio existe em razão de uma bomba, de uma destruição. O fio do novelo se expande e se amplia como trama, agenciamento, rizoma, conexão. A bomba se expande destruindo tudo , o novelo se expande construindo a tessitura de um mundo, mesmo que ainda por vir . Poesia, filosofia, educação, cultura, arte, ideias...são fios de cores diferentes que se ligam ao mesmo novelo democrático multicor. Os que fazem apologia do ódio, da intolerância, do preconceito... são como fios ligados a uma bomba: cedo ou tarde, a bomba explodirá perto dele, às vezes sob a forma de uma faca.

( imagem: Arthur Bispo do Rosário. Muitas vezes, Bispo do Rosário desfazia a forma acostumada das coisas prontas, como lençóis, toalhas e até mesmo o uniforme de louco que punham nele, para achar nelas o fio de que elas eram feitas. De posse desse fio, ele o ligava ao novelo que estava dentro dele e do qual ele havia se perdido, para assim reinventar, bordando, o sentido das coisas e de si mesmo, com arte)


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