quinta-feira, 14 de dezembro de 2023

A sociedade política

 

Os filósofos que estudam a formação das sociedades humanas ao longo da história  apontam para a existência de três agrupamentos: a família , a aldeia e a pólis ( a sociedade política).

 Na família , o chefe era o  “pai”, sendo o sangue  o princípio que une a família  . A aldeia nasceu do agrupamento  de famílias, com a mais poderosa delas ocupando o poder  e tendo a maior posse de bens e terras. De certo modo, a aldeia é uma extensão da família tornada clã.

Mas acontece algo diferente com o surgimento da pólis enquanto sociedade política: as relações políticas não são uma extensão da família, tampouco  a pólis está assentada no sangue ou  na posse de bens e terras.

A sociedade política segue uma lógica diferente da família e da aldeia: na pólis, o poder não deve ter por suporte o “homem-pai” ou o chefe do clã, e sim a liberdade e a  igualdade , incluindo a igualdade entre  homens e mulheres.

 Se na família o vínculo é o sangue, na sociedade política o liame é a regra social instituída conforme deliberação coletiva.

Os membros de uma mesma família  ou clã são parentes, porém os membros de uma sociedade política são cidadãos/cidadãs: somente na sociedade política surge o “outro” como valor relacional fundante. Os partidos políticos, por exemplo, devem existir  em razão da sociedade política, e não das famílias ou clãs.

Por isso, somente na sociedade política pode haver, de fato, a socialização do ser humano :  a socialização não pode ficar restrita  à família  , já que a socialização requer a dimensão social do “outro”, base da educação.

A socialização pressupõe a ideia de que o outro diferente de mim é, do ponto de vista social, um igual a mim, independentemente se ele tem ou não meu sangue, se ele é ou não proprietário  de bens e posses.

Os que têm ódio à política e exaltam a “família conservadora ” como fundamento da “pátria” , tal como pregam o  inelegível e seu “clã”, esses  em geral   têm baixo grau de sociabilidade e desprezam a educação emancipadora.

 Não por acaso, milícias e máfias têm uma estrutura calcada nesse tipo de “família-patriarcado-clã” . E quando tal família-clã vira inimiga da outra, isso sempre acaba em “derramamento de sangue”, pois é o sangue , e não a regra social democrática, o critério que une ou separa, com ódio mortal, aqueles cuja mente não alcançou o nível civilizatório da pólis.

E ainda há os “liberais”, para os quais é o indivíduo e seu ego, e não a sociedade política, o fundamento de tudo.

Quando liberais e (ultra)conservadores se unem , como vemos agora, nasce a aliança antissocial do dinheiro com o sangue, do capital com o conservadorismo-patriarcal, de tal maneira que as corporações se tornam clãs , incluindo os “clãs” da mídia corporativa, que ameaçam a sociedade política plural e a luta pela igualdade e justiça social . 


Espinosa é uma das referências do texto:


 

Um comentário:

cauepizindim disse...

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BRAILE
(para pessoas de visão)

Quem não?

Quem, algum dia, não pegou um lápis e desenhou no papel o contorno da própria mão?

Quem não teve essa oportunidade de, interagindo com um papel e um lápis, e vendo a representação gráfica visual da sua mão e do que ela pode produzir no mundo, experimentar a potência da ação?

Entretanto, esse simples ato (desenhar) provocou mudanças no papel, no lápis e na percepção do desenhista. E, também na sua relação com o mundo.

Uma imagem é a ideia que se forma na mente, mediante nossas interações com o mundo, através dos sentidos e, que produz em nós algum sentido.

Cada um de nós tem uma pele que nos delimita. É a pele que nos separa e nos liga ao universo, no qual estamos contidos, e que liga esse universo ao universo interior peculiar a cada um. Aí moram as idiossincrasias mas também a sensibilidade. A pele é o limite do corpo; mas, não limita a sensibilidade humana. Não necessariamente.

Também existem outros sentidos, além do tato, da visão, da audição, do olfato e do paladar. E cada sentido nos dá alguma informação do mundo que nos cerca. Estabelecemos diálogos entre o mundo interior e o exterior através de um sentido muito especial que resulta desses sentidos primeiros: o sentido de humanidade.

O que significa o sentido de humanidade?

Significa nos reconhecermos uns aos outros; e uns nos outros. Isso requer um diálogo que ecoe em nós...

Quem tem dois olhos, enxerga. Assim como, enxergam, o caolho e o vesgo. Mas o cego também vê, formando imagens mentais; com apurada sensibilidade, com as pontas dos dedos, vai desenhando, reconhecendo e significando seu mundo.

Então, pergunto:
Quantos de nós?
Algum dia vamos ver o desenho da nossa própria humanidade?

O que nossas mãos realizam, por correr ou não correr um risco, contornando as consequências dos atos e omissões?

A Humanidade precisaria repetir aquele ato de traçar um risco em torno dos dedos da mão e, fazendo a leitura do sinal universal de "PARE", ressignificar a contribuição de cada um na história.

Parar, pensar, sentir. Refletir e sentir...

Sentir o gosto do sangue.
Sentir o cheiro do sangue.
Ouvir os gritos da dor.
Ver a cor do sangue que lhe escorre das mãos.
Sentir o calor humano que se esvai na desumanidade.

Não é possível ler em braile sem ter sensibilidade na ponta dos dedos.

O nosso entorno nos dá contorno. Somente no diálogo encontramos retorno.

Diálogo.
Mesmo que seja em libras, alguém poderá nos "escutar".

Caso seja preciso desenhar:

As guerras destroem a humanidade nos "vencedores"...

BASTA ! 🖐🖐🖐🖐🖐