A nave Voyager ,
enviada ao espaço há mais de 30 anos, ultrapassou as fronteiras do sistema solar: ela agora navega no oceano desconhecido do cosmos. As últimas
coisas que a nave viu foram os berçários
cósmicos com sóis e estrelas recém-nascidos, como crianças
.
A nave é feito
uma carta que tem apenas o endereço do
remetente : o planeta terra. E seu
destino lembra o daquelas mensagens lançadas ao mar no interior de uma garrafa.
O astrônomo e
escritor Carl Sagan teve a ideia de colocar um cd
feito de ouro nessa nave. Há sons gravados no cd : são mensagens com as quais desejamos
expressar quem somos ao cosmos.
O ouro foi
escolhido pela sua durabilidade, não
pelo seu valor monetário. Ideia assim jamais teria o cúmplice do m-i-l-i-c-i-a-n-a-t-o
Elon Musk, cujo projeto espacial é ver se tem ouro em marte para surrupiá-lo....
Esse disco-cd
pode durar até um milhão de anos, tempo superior ao que os cientistas supõem
que a humanidade ainda durará.
Daqui a um
milhão de anos talvez sejamos apenas o
relato de certo ser estranho já extinto , um mistério a decifrar gravado num
disco de ouro.
Estão
gravados no disco , como poéticos
testemunhos do que somos e sentimos: sons
de grilo e sapo; uma baleia cantando; as batidas do coração de um
recém-nascido, e as primeiras palavras de sua mãe quando ele abre os olhos; o
som das ondas cerebrais de uma jovem que acabou de se apaixonar; um cão latindo feliz com o retorno à casa de seu
amigo-humano; o estalar de um beijo;
sons de chuva e vento; o ribombar de um trovão ; risos de crianças brincando; o
som suave de uma página de livro sendo folheada; e um “bom dia” dito em diferentes línguas e dialetos, como uma multitudo sonora.
Daqui a um
milhão de anos talvez já tenha virado pó tudo o que o dinheiro hoje
compra; e apenas pó também sejam o
Paraiso e o Inferno que o fanatismo
teológico-político vocifera e em nome
dos quais nos ameaça com suas fogueiras
( literais e simbólicas). Mas para que
durem ainda muito nossas vidas, que não tarde o dia em que vire
pó o obscurantismo e sua n-e-c-r-o-p-o-l-í-t-i-c-a.
O poeta Manoel
de Barros dizia :“ poderoso não é quem descobre ouro, poderoso é quem descobre as insignificâncias”. As
“insignificâncias” são pequenos acontecimentos vitais cuja grandeza é ignorada
pelos homens e suas “importâncias”. Naquele disco da nave estão gravadas
“insignificâncias” endereçadas a olhos e ouvidos cósmicos .
Talvez sejam
esses mesmos olhos e ouvidos que, no aqui e agora, abrem-se no poeta :
alguém que vê essas “insignificâncias” e as eterniza como palavra poética que faz pensar,
sentir e educa.
São essas
insignificâncias sentidas , vividas e
partilhadas a verdadeira riqueza daquele disco de ouro que enviamos à
eternidade.
(imagem : “Reflexões sobre a estrela Ursa Maior”, pintura
expressionista de Pollock, unida a uma
foto do universo, obra de arte igualmente
expressionista)
"Insignificâncias manoelinas" = "as coisas
favoritas" que Coltrane musicou:
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