Nesta semana se comemora o Dia do
Escritor/Escritora. Homenageando Manoel de Barros, deixo aqui minha homenagem
também a todas as escritoras, escritores, leitoras e leitores. Enfim, a todos
aqueles e aquelas que agem para que a
força esteja nas ideias e nos livros, não em armas.
Manoel de Barros só escrevia à mão
sua poesia, e sempre a lápis. Nunca lapiseira de plástico, sempre lápis de
madeira.
Curiosamente, “digitar” é um ato que
faz parte da atividade de “bater”, “golpear”. Quem digita, bate com os dedos
nas teclas. Já escrever à mão expressa outro tipo de movimento: desenhar.
Quem escreve agencia sua mão com o
corpo do lápis, e por intermédio deste é nosso corpo que também escreve, com
seus nervos e fibras, incluindo as do coração. Quem escreve à mão desenha,
parecendo às vezes que o lápis também dança na ponta de seu grafite, como a
bailarina equilibrada na ponta dos pés.
Para que na palavra também se
expresse a pluralidade sensória da vida, mais adequado é o lápis do que
teclados . Pois palavra digitada é 1 e 0 combinados segundo a lógica digital binária, mas o grafite que o lápis liberta
veio da imanência da terra: primo do diamante, o grafite é feito de carbono,
base da vida.
O cérebro não funciona da mesma
maneira quando se digita e quando se escreve à mão, quando se bate e quando se
desenha, quando se golpeia e quando se dança.
Há certa violência em bater-digitar.
Talvez essa seja uma das razões que explique porque os fascistas gostam tanto
de violentar também as teclas e, por intermédio destas, as ideias (encontrando
no meio digital um ampliador de suas violências físicas e simbólicas).
Além disso, sem que saibamos, há o risco de o
capital cibernético reduzir a algoritmos tudo o que digitamos nas redes
sociais , para assim nos oferecer como
mercadoria aos novos mercadores de gente, sempre ávidos por inescrupulosos
lucros.
Na madeira do lápis do poeta ainda
vive e resiste a árvore que um dia fez parte do Pantanal que os criminosos hoje
incendeiam , para tudo reduzir a pasto de gado obediente .
Por intermédio do lápis do poeta
continuam a falar as árvores, as florestas, os bichos, as plantas, os pássaros
, as paisagens, os verdes e seus infinitos tons, o azul e seus horizontes...
Enfim, fala tudo aquilo que os destruidores da vida querem calar e matar. Por
meio da palavra libertária que ele cria
e ensina, no lápis do poeta o grafite se torna diamante.
Nada contra o digitar, porém escrever
à mão, a lápis, é ato mais afim ao poema que , como gente, também nasce: “Na
ponta do meu lápis há apenas nascimento”, escreve o poeta.
Um comentário:
Acontece aqui uma exposição de obras de Arthur Bispo do Rosário. Antes de ir ver, leio esse blog, enquanto espero. E, grata coincidência, foi numa busca pela obra de Bispo do Rosário no google, que cheguei no Multitudo. Também, foi nesse dia que corri o risco sobre o papel para desenhar as letras que seguem:
Trama e Urdidura
Uma louca homenagem à vida e obra do louco Arthur Bispo do Rosário
por robertomarques
Tramando A Vida, O Fio E O Desenho
Sobre o papel apóias tua pena.
Sem temor e sem dó,
Marcas um ponto de início
E deslizas a mão ao teu alvedrio.
E só.
Não havendo para tanto, outro limite
Que não o do papel e da tinta,
A desenhar tua história em movimento.
Ao sabor da vida e ao teu alvitre.
Até o ponto em que paras o tento
E elevas a pena já pura
Para ver o risco que correste
Tramando contra a urdidura.
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