sábado, 19 de maio de 2018

destino e liberdade


Quem deseja tecer deve partir de uma “urdidura”. Não importa se são tecidos, textos, ideias ou ações que desejamos tecer: é sempre de uma urdidura que se parte. “Urdidura” vem de “ordo”, “ordem”. Como ensina Espinosa em sua “Ética”: em tudo há “ordo”, mas “ordo” não é tudo.
Toda urdidura é feita de fios dispostos retamente, como um destino, e disso já sabiam as mitológicas Moiras, que urdiam o destino dos homens. Mas apenas uma urdidura não forma um tecido de vida: é preciso a “trama”.
A trama nasce de um fio que passa transversalmente pela urdidura: a trama acrescenta ao férreo destino a invenção de fugas, de “linhas de fuga”.
Toda urdidura é sempre igual: reta e determinada. Porém, há múltiplas formas de se fiar uma trama. Não há trama sem uma urdidura , isso é certo; porém não há tecido , de pano ou social, sem a invenção de tramas. Da “Moira Social” que o urdiu louco, Arthur Bispo do Rosário reencontrou sua transversal, e assim tramou sua lucidez como fuga da normalidade reta dos que pensam igual. Embora toda trama parta de uma urdidura, nenhuma urdidura pode determinar que trama se inventará a partir dela.
A gramática é urdidura, porém trama é a poesia; a lógica é urdidura, mas pensar é trama; família é urdidura, amor é trama; Estado é urdidura, sociedade é trama; código jurídico é urdidura, justiça é trama; sistema político é urdidura, democracia é trama.

( "O manto", Arthur Bispo do Rosário)



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