quarta-feira, 20 de janeiro de 2016

artigo publicado na Revista Trágica



Título do artigo: "Deleuze e Guattari: o gosto filosófico"


(trecho)

O batismo do conceito solicita um gosto filosófico.
(Deleuze & Guattari,  O que é a filosofia? , p. 16)


 Deleuze intitula pop’filosofia a relação entre o pensar e o sentir, entre a ideia e a sensação, entre o conceito e a imagem. “Pop” como popular. O popular não é o massificado, o popular não é o que custa barato. Ao contrário, custa muito o popular: custa não em moeda ou capital, mas em modéstia e gosto. O popular não é o que vende muito: o popular é o que não se deixa vender, seja pelo mercado seja pela potesta do Estado. O popular não se opõe ao erudito. O popular não se confunde com classe ou gênero. O popular não é a classe  C, D ou E. O popular é inclassificável: multitudo.O popular é composto pelo povo que a Terra, a grande desterritorializada, pede para si. Povo bastardo, mestiço, despossuído, “Ninguém”, como diria Manoel de Barros: “Falar a partir de ninguém/ Faz comunhão”[1]. “Comunhão” como produção de um agente coletivo de enunciação. Povo ao mesmo tempo nobre e menor, como a cartola do Angenor, como o sax de Pixinguinha. Nomadologias: agenciamento do pop com o “geo” de uma geofilosofia , para assim potencializar o gosto pela Terra. O popular é o devir-minoritário de cada um: “escreve-se em função de um povo por vir e que ainda não tem linguagem”[2].



[1] BARROS, M. Ensaios fotográficos. Record, 1996, p.25.

[2] DELEUZE, G. Conversações, p. 179.Nossa interpretação acerca da natureza ao mesmo tempo estética e política do gosto,  interpretação esta presente em todo o artigo, encontra apoio no próprio Kant, que identifica o gosto ora com uma faculdade ora com um “senso comum”. Contudo, o “comum”  referido pelo gosto não é apenas subjetivo : ele também serve de base a um pensamento sobre a comunidade política, fato que ensejou a especulação de que Kant ainda prepararia uma “quarta Crítica”: uma Crítica da razão política. Sobre esse tema, embora de uma perspectiva um pouco diferente da que apresentamos aqui: PROUST, F. Kant le ton de l’histoire. Paris:Payot, 1991, p 34 e seguintes.

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