sábado, 18 de janeiro de 2025

Espinosa: saúde da mente e do corpo / Deleuze: 100 anos

 

Em sua Ética, Espinosa ensina que a saúde do corpo depende de que  ele se nutra de alimentos diferentes (Ética, Quarta Parte, Apêndice, Capítulo 27). Não alimentos caros, mas alimentos diferentes, até mesmo simples. Pois a multiplicidade aumenta a potência e saúde da singularidade que a incorpora  , fazendo a diversidade ser   parte  integrante de si.

Mas para que esses alimentos diferentes potencializem o corpo que deles se alimenta, é preciso que esses alimentos se componham , ou seja, que a união deles seja um acréscimo de força, de saúde e até mesmo de harmonia, como numa polifonia musical feita com sons de instrumentos diferentes que, juntos, criam uma música singular, única. 

Nosso corpo é composto de diferentes tecidos, de variadas estruturas ósseas, de sutis construções nervosas; e toda essa heterogeneidade que nos compõe , e que faz de cada um de nós um ser único, requer igualmente uma heterogeneidade de alimentos para manter-se e regenerar-se.

 Ao contrário, um corpo que se alimenta de apenas uma coisa, ou de poucas coisas, empobrece sua potência e saúde, uma vez que essa única coisa ou poucas coisas ingeridas irão alimentar apenas poucas coisas em nós , criando assim um desequilíbrio e uma desarmonia. Como resultado, nosso corpo será um misto debilitante  de excessos e carências.  

Se para nos alimentar dependêssemos apenas da monocultura que o agro-ogro produz, estaríamos todos doentes...O que nos salva é a riqueza plural da pluri-agricultura familiar.

O que vale para nosso corpo vale ainda mais para a nossa mente. Uma mente potente é aquela que se nutre de ideias múltiplas, diversas, plurais. Ideias que vêm não apenas de livros, mas também de músicas, filmes, pinturas,  poesias, exposições , enfim, ideias múltiplas que nascem da vida, ideias para serem pensadas, sentidas , vividas e postas em prática.  

São essas ideias plurais que alimentam e enriquecem de vida pensante uma mente singular. São elas que garantem a saúde da mente, tanto a mente individual quanto a coletiva . Enfim, uma polifonia de ideias expande a mente , tornando-a criativa e aberta à heterogeneidade do próprio mundo.  

Ao contrário, a mente que se nutre de uma ideia única, na verdade não se alimenta, e sim se envenena. Mente assim se fecha à heterogeneidade da realidade,  passando  a negá-la ou a temê-la . E disso se aproveitam os dogmas, as “seitas” de toda espécie ( incluindo a “seita do Mercado” ), os fanatismos, as palavras de ordem e tudo aquilo que alimenta a ignorância em suas diversas formas.


(Imagem: “Polifonia”/ Paul Klee)




Inspirando-me em Espinosa, sempre gosto de trazer pintura , poesia e música para acompanharem as ideias escritas, para assim enriquecerem  com pluralidade o aprendizado ( unindo ideia e afeto, intelecto  e sensibilidade). Creio que essa lição espinosista também se encontra em Deleuze quando criou a ideia de “pop’filosofia”, que é a filosofia agenciada com as artes. A pop’filosofia une mente e corpo, ideias e afetos, pois é a criação de uma filosofia aberta à não filosofia. 

Hoje, 18/01/2025, Deleuze faria 100 anos. Em homenagem a ele, deixarei uma música de um artista que era um de seus preferidos: Bob Dylan ( inclusive, Deleuze cita Bob Dylan ao falar da pop'filosofia):




Nenhum comentário: