Sou o mais velho de cinco irmãos.
Filho mais velho, dizem, precisa dar o
exemplo. Porém, quando criança fui vizinho de um garoto chamado Edinho. Ele era
quatro anos mais velho que eu, diferença que contava bastante.
Edinho foi não só meu primeiro amigo,
ele também era o irmão mais velho que eu não tinha: com ele eu podia ser irmão caçula ( não em sangue, mas em afeto).
Foi Edinho que me despertou a vontade
de querer aprender a ler, pois quando eu tinha 5 anos via Edinho sempre
com gibi na mão, lendo. Como eu o
imitava em tudo, também queria aprender a ler para fazer amizade com os gibis,
que tanto roubavam a companhia do meu amigo de mim.
Aos olhos do meu pai, Edinho tinha
apenas um defeito : ele era “botafoguense” ( meu pai era flamenguista de
“carteirinha”).
Sabendo de sua influência sobre mim,
quando fiz 6 anos Edinho juntou dinheiro e me deu, como presente de
aniversário, uma camisa do botafogo novinha. Não pensei duas vezes: coloquei a
camisa, virei botafogo...
Quando meu pai me viu com a camisa, a
expressão de decepção no rosto dele era indescritível, mas ele nada disse.
Pouco tempo depois , ele me falou: “filho, vamos ao maracanã?” Era a
primeira vez que eu iria ao maraca! Fomos assistir a um flamengo X bonsucesso,
numa quarta à noite, mais de 40 mil presentes. O jogo estava difícil, o
bonsucesso tinha um bom time.
Mas eu não estava nem aí para o jogo, eu era
botafogo! E meu pai, querendo me agradar, pagava tudo o que eu pedia para
comprar dos ambulantes: sorvete, biscoito, doce...
Começou o 2º tempo, zero a zero ainda . Até que, à beira do
campo, começou a aquecer um garoto para entrar no flamengo.
Meu pai me segurou no braço e disse, cheio de esperanças: “filho, não tire os
olhos desse garoto que vai entrar!”
Olhei para o garoto sem entender as
palavras esperançosas de meu pai: o garoto era magrinho, o uniforme o
engolia... Pensei comigo, enquanto saboreava um sorvete: “Meu pai não sabe
nada...”
Até que o garoto entrou...A primeira
vez que ele tocou na bola, esqueci o sorvete, pois ele fez um lançamento
maravilhoso que gerou o primeiro gol do flamengo. O garoto parecia um artista,
um pensador da bola. Enfim, ele acabou com o jogo.
Aquele foi um dos primeiros jogos do
Zico (embora com a bola no pé fosse um craque, lamentavelmente esse jogador não teve o mesmo talento em suas
escolhas políticas, descobri isso depois que cresci).
Quando saímos do maraca, esqueci o
botafogo e, pela primeira vez, divergia
do meu querido amigo Edinho. De mãos dadas com meu pai , olhei para ele
com meus olhos de menino e disse comigo: “Meu pai sabe tudo.”
( Imagem: o filósofo Gilles Deleuze com
o pequeno Julien , seu filho )
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