segunda-feira, 27 de junho de 2022

para ser grande

 

Há um poema de Fernando Pessoa no qual ele nos ensina o que é preciso fazermos para “sermos grandes”.

Segundo o poeta, para sermos grandes de verdade não precisamos comprar nada, nem acumular coisas, tampouco ambicionar ser o primeiro lugar em pódios.

O poeta diz mais ou menos o seguinte: “Para sermos grandes , devemos fazer como a lua que nunca se recusa a refletir-se inteira na mais simples poça do caminho”.

 A lua é grande porque ela não rejeita a poça julgando-a indigna de receber sua presença: ao contrário, é a presença da lua na poça que dignifica a poça. A lua engrandece a poça sem ser diminuída.

A lua não se reflete pela metade ou em parte na poça, ela se coloca por inteiro, nos ensinando o que é ser íntegra. Assim, a lua horizonta a poça: faz dela um espelho unindo terra e  céu.

A lua não se reserva apenas para os oceanos. Não é o tamanho daquilo no qual ela se reflete que faz a grandeza da lua, é a grandeza da lua que engrandece a realidade na qual ela se reflete.

A primeira vez que li esse poema foi numa aula de filosofia no antigo segundo grau.

Li o poema e não entendi tudo, mas fiquei com ele na cabeça. E na minha cabeça havia também nuvens espessas  turvando minha visão acerca do futuro ( eram épocas difíceis, ainda havia a ditadura militar cerceando  tudo ...).

A querida professora que me apresentou o poema me disse que o sentido dele levaria tempo para a gente compreender, pois era um sentido para ser compreendido não apenas com a mente , mas também com o corpo;  e que eu  compreenderia o sentido quando dentro de minha mente houvesse um clarão. Poemas assim a gente lê para se ler.

Quando sai do colégio após a aula,  já era noite . Choveu  muito a tarde inteira, as nuvens pareciam de chumbo. No asfalto ,  aqui e ali , poças que a chuva deixou.

Eu caminhava de cabeça baixa olhando para o chão , como se dentro de meu pensamento pesasse um chumbo.

De repente, numa poça do caminho eu vi o reflexo da  lua cheia, ela brilhava no espaço que conseguiu abrir entre as nuvens pesadas.

Ao ver a lua refletida na poça, de imediato levantei minha  cabeça  , ergui os olhos e a vi no alto, ao mesmo tempo que abria minha mente  o poema sob a forma de um libertador  clarão.



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-Ideia semelhante é narrada neste excelente livro:



 

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COMO BROTA UM VERSO / de Rilke

 

Os versos não são, como imaginam as pessoas, simples sentimentos… Eles são experiências. Para escrever uma única linha, um simples verso, é preciso ter visto muitas cidades, muitas pessoas e muitas coisas; é preciso conhecer os animais, sentir como os pássaros voam nos céus e perceber o movimento de uma flor que se abre pela manhã.

É preciso evocar caminhos por regiões desconhecidas, em encontros inesperados e separações longamente previstas; em dias da infância ainda não esclarecidos; nos pais que tivemos de magoar quando nos traziam uma alegria e nós não a compreendemos (era uma alegria para outro); em doenças de infância que começam de maneira tão estranha, com tantas transformações profundas e graves; em dias passados em quartos calmos e recolhidos e em manhãs à beira-mar; no próprio mar, em mares, em noites de viagem que passaram sussurrando alto e voaram com todos os astros — e ainda não é bastante poder pensar em tudo isto.

É preciso ter recordações de muitas noites de amor, das quais nenhuma foi igual a outra; de gritos de mulheres no parto e de parturientes leves, brancas e adormecidas que se fecham. Mas também é preciso ter estado ao pé de moribundos, ter ficado sentado junto a um morto numa casa de amplas janelas abertas e aos ruídos que vinham por acessos.

Mas não basta ter recordações. É preciso saber esquecê-las quando são muitas, e é preciso revestir-nos de paciência infinita até que regressem à mente. Pois essas mesmas recordações ainda não são tudo de que é preciso. E só quando chegarem a fazer parte de nossas entranhas, quando se converterem em aspectos e gestos de nosso ser, quando já não têm nome e já se não distinguem de nós mesmos — só então é que pode suceder que, numa hora muito rara e estranha, façam surgir a primeira palavra dum verso que brota.


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Quando ouvi o astrônomo erudito

( Walt Whitman)

 

Quando ouvi o astrônomo erudito,

Quando as provas, os números, foram listados em colunas diante

de mim,

Quando me foram apresentados os mapas e diagramas, para

somar, dividir e medi-los,

Quando eu, sentado, ouvi o astrônomo no auditório em que

apresentava sua palestra com grande aplauso,

Bem cedo e sem conta me senti cansado e enojado,

Até que, levantando-me e saindo silenciosamente, fui perambular

na solidão,

No místico ar úmido da noite e, de tempo em tempo,

Mirava no céu a perfeição silenciosa das estrelas.

 


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