Entre alguns filósofos-poetas antigos, a sabedoria mais buscada, porém a mais difícil de
alcançar e aprender, não era sobre o Cosmos ou Deus, tampouco se podia
conquistá-la mediante a mera teoria.
O nome dessa sabedoria era: “cardiognosia”, ou conhecimento
dos corações humanos. Tal conhecimento devia começar na observação de si mesmo,
para depois se dirigir aos outros.
“Sinta a si mesmo como se fosse o outro, sinta o outro como
se fosse a si mesmo”, essa era a
primeira das lições da cardiognosia.
Segundo os mestres cardiognósticos, as palavras que vêm do
cérebro , teóricas que são, às vezes mentem ; porém nunca mentem as palavras
que vêm do coração, pois através delas é dito o que o corpo sente, e o corpo
nunca mente.
Assim, a cardiognosia não é teoria apoiada em palavras que nascem na boca, pois às vezes somente o
silêncio consegue dizer o que o coração pensa e sente.
O coração é o primeiro dos órgãos a se formar. Ele se forma
antes do cérebro, antes dos pulmões, antes do estômago.
No feto, o coração
começa a bater por volta do décimo sexto
dia. Essa inaugural batida é a primeira nota musical de um ritmo vital que
crescerá protegido no útero da mulher.
Os cardiognósticos achavam que era o coração , e não o cérebro,
a sede dos pensamentos mais importantes à vida. Talvez eles não estivessem errados , movidos que estavam pela intuição
de um pensamento originário, um pensar-pulsante, do qual o coração é a sede e o agente.
Quando estamos tristes ou nos imaginando derrotados
, nosso cérebro parece que perde
a vontade de pensar, deixando-nos resignados; porém o pensar do coração tem uma força maior que
toda vontade :estejamos alegres ou tristes, saudáveis ou doentes, o coração pulsa não por escolha, mas por vital
necessidade. “Coragem”: “força que nasce
do coração”.
O pensar do cérebro tem por sujeito o “eu”, já o pensar do coração é criação da vida , sua
arte originária .
As ideias que o
cérebro pensa dependem dos neurônios;
porém os neurônios não conseguiriam
respirar não fosse o oxigênio que o
coração lhes envia no fluxo do sangue: antes de os neurônios pensarem, o
coração pensa neles antes.
Creio que todas as ideias que o cérebro pensa o coração é
capaz de senti-las, para assim avaliar o quanto tais ideias enfraquecem ou
fortalecem a vida, se são veneno ou remédio.
Mas por virem antes e terem primazia, as ideias originárias do coração
somente ele é capaz de pensar :são ideias não teóricas, ideias para serem
sentidas também com o corpo, como as
ideias vitais da poesia.
“Por mais longe que a razão nos leve,
leva-nos mais longe o coração".
(Goethe)
( poucos chegaram tão
perto desse pensar originário , um pensar que também se sente, na dor ou na
alegria, quanto a “cardiognóstica” Clarice)
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