quinta-feira, 11 de fevereiro de 2021

manoel de barros: poesia pode ser que seja fazer outro mundo

 

Certa vez pediram ao poeta Manoel de Barros uma definição do que é a poesia. O poeta assim respondeu: “Poesia pode ser que seja fazer outro mundo”. Nessa resposta, a palavra mais importante é o verbo “fazer”. Inclusive, a palavra “poesia” vem de um verbo grego  cujo sentido é exatamente “fazer, produzir”. Quando se  substantiva a poesia apenas como rima e verso , perde-se a compreensão de que ela é também um verbo, uma ação, que pode produzir muitas outras coisas além de rimas e versos. A poesia produz também percepções, pensares e sentidos outros que subvertem o “mesmal”  do “mundo acostumado” . Manoel diz que o poeta produz versos porque , antes de escrever, “o poeta  se empoema”. Empoemar-se é um sentir que pensa, tornando-se potência criativa  que nasce de uma intensificação da vida. A vida nos empoema quando ela mesma escreve sua poesia em nós. A vida produz poesia fazendo nascer na mente e no corpo ideias  e sensações que aumentam a vida em nós. Pois a  vida é a primeira dos poetas, cujos poemas nós mesmos somos.  Quem se empoema,   desegoifica-se  e se desabre:  não cabe mais dentro de si.  Alguns se empoemam  e dançam, outros se empoemam e pintam, outros se empoemam e cantam, outros se empoemam e  ensinam, outros se empoemam e aprendem,  outros se empoemam e se tornam generosos, corajosos, insubmissos,  libertários , enfim, intensificam o que neles é vivo ;  e com o máximo de força que podem , se esforçam para fazer outro mundo começando pelo lugar onde se está, mesmo que seja um lugar modesto, micropolítico: sala de aula, fábrica, rua, praça, residência, favela, vizinhança, janela, mundo virtual... E primeiro que tudo, deve-se começar por fazer outro mundo dentro de si mesmo, na maneira de pensar e sentir, fazendo-se de novo página branca, sem roteiros prévios , para que nela a vida reescreva novos sentidos por descobrir , sentidos  que nos auxiliem a resistir à antipoesia dos homens cultuadores do ódio, da destruição e da morte. É por isso que o importante naquela definição de poesia  também  é o “pode ser que seja”,  pois poesia não é   palavra de ordem , fórmula  ou receita;  poesia  é ideia pensante  para ser sentida e reinventada, reinventando-nos , como potencialização da liberdade agenciada. 

“Mais importante do que o pensamento é o que ‘dá a pensar’; mais importante do que o filósofo é o poeta”. (Deleuze)


Não são apenas os órgãos da sensibilidade que são capazes de sentir, pois o pensamento também sente; e não é somente o pensamento que é capaz de pensar, os órgãos da sensibilidade também pensam. A separação entre sensibilidade e pensamento não é algo natural, é uma construção histórica .Em Plotino, por exemplo, a filosofia consiste em tocar com pensamento as coisas incorpóreas, e ao mesmo tempo  pensar com o tato as realidades corpóreas. 













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