sábado, 6 de janeiro de 2018

o tamanho do nosso quintal ...


Meu quintal é maior do que o mundo.
Manoel de Barros

Quando Proust diz : "Mais importante do que viajar para conhecer paisagens novas, é ‘conhecer’ de forma nova a paisagem habitual”, o primeiro conhecer e o segundo são iguais apenas na palavra, na forma , pois eles não expressam o mesmo ato, nem possuem o mesmo conteúdo. O primeiro conhecer busca uma paisagem já conhecida por alguém  diferente de nós,  para o qual ela é uma paisagem habitual, “acostumada” . Para este outro, porém, nova seria a paisagem habitual nossa, que talvez ele sonhe em conhecer.
Semelhante a uma  “miopia existencial”, nossa visão acostumada   imagina  que o novo e o diferente só podem ser vistos em lugar afastado do nosso quintal. Assim vistos, o novo e a diferença são mais fantasiados do que propriamente experimentados realmente, parecendo que essas paisagens novas apenas existem para que possamos tirar “selfies” e ostentá-las , com elas atrás de nós, e não dentro, como experiência também mental ( da qual não se pode tirar fotos).

O segundo conhecer, o que descobre o novo no seio do acostumado, desfazendo-o,  abre  em nós olhos de recém-nascido : “outro ser desabre em nós”(Manoel de Barros). Esse segundo conhecer é ainda conhecer, ele não é ignorância ao modo de Sócrates ( o “só sei que nada sei”), pois não há nenhuma virtude ou potência na ignorância, mesmo “Douta”. É sempre no conhecer que está a potência libertária, pessoal ou coletiva. Sobretudo quando ele se apoia em uma “visão fontana”, como diz Manoel de Barros,  que torna o conhecer e o (re)descobrir atividades sinônimas.



Nenhum comentário: