sábado, 13 de janeiro de 2018

as carruagens

Na mitologia, comparava-se a alma humana à carruagem. Mesmo Platão se serve desse mito, adaptando-o. A carruagem de Platão compõe-se de três elementos: o cocheiro e dois cavalos . O cocheiro é a Razão: ela tem as rédeas e guia a carruagem por caminhos retos traçados com régua. Um dos cavalos, de cor branca, é dócil  aos comandos da razão: trata-se da "Vontade". Mas o outro cavalo, de cor preta, é indisciplinado, rebelde. Quanto mais a Razão quer comandá-lo, mais rígida ela precisa ser. Este cavalo insubmisso é o "Desejo".
Segundo Platão, na carruagem de nossa alma a Razão e o desejo, o cocheiro e o cavalo preto, estão sempre em conflito. A Razão quer “Ordem”, e por vezes fala por ela o seu chicote; porém o desejo deseja “ir atoamente”,  nomadicamente...
Carruagem diferente era a de Dioniso, divindade das artes. Nela, Dioniso também era o cocheiro, mas sem querer ser ou ter a “Razão”. Ao invés de cavalos, sua carruagem era puxada por panteras não domesticadas. Apesar de feras, Dioniso as guiava sem usar chicote. A arte não nega ou reprime a natureza ( como o cocheiro de Platão), mas a põe a seu serviço conforme uma disciplina que não é estrangeira à potência das panteras. Na natureza, as panteras são solitárias e jamais se unem. Porém, sob as mãos da arte, as pulsões-panteras se tornam forças que se conjugam, que se agenciam, e conduzem a alma por sendas onde a razão não ousa ir.

Dioniso transforma a agressividade destrutiva e mortífera das pulsões-panteras em potência criativa afirmadora da vida. Dioniso é o próprio desejo que se tornou guia, cocheiro, pensador; conjugando disciplina e inventividade na condução da carruagem . Esta segue para onde não se sabe: seu destino é o próprio percurso enquanto este é criado.


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