sábado, 17 de maio de 2025

Eros, Psiquê & Cupido

 

                                                  EROS & PSIQUÊ[1]

 

Existiu na Grécia uma jovem chamada Psiquê. Sua beleza era tanta, que a própria deusa da beleza se sentia inferiorizada diante de Psiquê. A deusa da beleza era Afrodite. Mas Afrodite era portadora da beleza física, esta que vemos com nossos olhos. Antes de Psiquê, conhecia-se apenas aquele tipo de beleza da qual Afrodite era a deusa. Psiquê, diferentemente, portava uma beleza distinta, pois “Psiquê” é o nome grego da Alma[1].

A Alma é bela, essa a mensagem que nos deixam os gregos. Sua beleza rivaliza com a beleza do corpo, a única que Afrodite conhecia. Todavia, enquanto Afrodite era uma deusa, Psiquê era uma simples mortal. Por não conter sua inveja, e querendo atingir a sua rival,  Afrodite resolveu vingar-se ...

Afrodite ( A Deusa da Beleza): "- Como!? Existe entre esses seres efêmeros, que mais parecem um pó rasteiro que o vento leva, existe entre os humanos alguém mais bela do que eu? Como pode!?E que nome estranho esse ser tem: Alma (Psiquê)...Como a alma pode ser mais bela do que eu, que sou o Corpo! Somente em mim pode haver beleza, já que beleza só existe para os olhos! E são os homens mesmos que me adoram com os olhos! Não apenas os homens me adoram. A prova disso é que meu servo maior é o Amor, que não tira os olhos de mim e me cobiça para ser posse exclusiva sua. Mas eu não cedo e jogo com ele, uso ele para reinar sobre todos. Essa tal de Alma não pode ser mais bela do que eu! Mas não quero ir conferir ou ficar em dúvida..."

(Afrodite manda chamar então Eros, o Deus do Amor, que era seu servo. Dirigindo-se a Eros, Afrodite ordena) :"Quero que você vá até o local no qual vivem os seres humanos , encontre uma jovem chamada Alma e atravesse o coração dela com sua flecha . Faça ela se apaixonar pelo homem mais pobre, burro e feio que houver em toda Grécia..."

O Amor só tem olhos para a beleza, ele detesta a fealdade. É preciso entender a fealdade em um sentido bem amplo, pois existem também palavras e ações feias. Nunca o Amor se enamora de tais palavras e ações: quando as vê, o Amor desvia os olhos. Por isso tais palavras e ações têm dificuldades em germinar, pois para que algo se reproduza é preciso a influência do Amor.

De tudo o que o Amor havia visto no céu e na terra, Afrodite era, sem dúvida, a coisa mais bela. Por isso, ele a acompanhava e fazia o que fosse do desejo dela. Em troca, a única coisa que o Amor exigia de Afrodite era vê-la e estar-lhe perto. Valendo-se dessa situação, Afrodite resolveu fazer de Eros a arma de sua vingança contra aquela que possuía uma beleza que não pertencia ao seu império.
E lá veio o Amor descendo do céu em busca da Alma na terra. O Amor nunca havia visto antes a Alma. Afrodite esquecera-se desse detalhe, pois o que poderia acontecer nesse encontro entre o Amor e a Alma? Ele nunca a tinha visto antes. Ele não sabia o que ia encontrar. Guiava-o a memória da Beleza do Corpo, pois tal Beleza era Afrodite. Nada do que seus olhos vissem fora dele poderia ser mais belo do que a recordação que vivia em sua memória, assim pensava o Amor antes de encontrar-se com a Alma. Afrodite era a coisa mais bonita que ele vira, e essa verdade o completava, desde que ele estivesse perto dela.

Porém, nem o Amor e nem o Corpo sabiam o que podia a Alma, sobretudo quando a vemos, quando nos encontramos com ela. Ouvir apenas falar dela não é conhecê-la. A Alma somente pode ser conhecida diretamente, sem intermediários.

 

Então, o Amor encontrou   a Alma, Eros conheceu Psiquê. Nesse encontro, o  Amor sentiu nascer dentro dele um outro, esse outro era um amor novo, que era o Amor mesmo, porém renovado, potencializado, mais amor do que nunca. Enquanto o amor pelo Corpo submetia Eros a caprichos e prazeres exigidos pelo ser amado, como se fosse um preço a ser pago, esse amor nascido do encontro com a Alma o fazia voltar-se para si mesmo e descobrir uma graça nascida de um desejo que não se esgota na posse e no imediato. O Amor percebeu então que ele podia ser reinventado, experimentar uma nova maneira de ele ser . E que ele próprio, o amor, desconhecia tudo o que o amor pode. Ele viu que se desconhecia e que havia nele potencialidades de amar que somente poderiam se tornar reais se ele se unisse à Alma. A união dele com o Corpo era exterior; contudo, o Amor sentia que para ele se unir à Alma ele deveria morar dentro dela: cada um seria no outro, sem carência ou falta. Mas o que é a Alma? Ela é invisível, intangível, porém como tem realidade e potência para quem a conhece! E quem a vê nunca mais a esquece. E ela não está nos céus, nem no Olimpo, ela vive dentro do ser humano. O Amor é eterno, mas não o é a Alma. Ela nasceu ninguém sabe como, pois onde menos se esperava , ali  nasceu ela. Ela não nasceu divina, nasceu humana. Sua divindade seria conquistada por Justiça, e não por nascimento ou aparência. Só uma divindade pode gerar uma divindade. Mas a Alma, embora não fosse divina,   fez nascer no Amor um ser novo, que era o Amor mesmo com  olhos outros, diferentes, capazes de verem  o que se esconde de belo nos homens, apesar de toda feiura que eles frequentemente são, dizem  e fazem.

O Amor, no entanto, não se revelou imediatamente. Ele guardou-se para o momento oportuno. E lá foi ele embora, com sua própria flecha atravessada no peito. A Alma, por sua vez, nada viu, porém sentiu atravessar-lhe um vento estranho.

 

O tempo passou , as irmãs de Psiquê se casaram e Psiquê permanecia só. Embora todos a considerassem bela, ninguém a pedia em casamento, tampouco ela se apaixonava por alguém. Contudo,  o que ninguém sabia, nem mesmo Psiquê, é que era o próprio Amor que evitava que a Alma se apaixonasse.

Achando a situação por demais estranha, o pai de Psiquê resolveu levá-la  até ao Oráculo de Delfos, para que o deus Apolo revelasse qual seria o futuro da jovem. Chegando lá, ambos ouviram da Sacerdotisa de Apolo uma revelação trágica: Psiquê deveria ir até um determinado castelo próximo dali. Chegando lá , Psiquê aguardaria pela chegada da noite. Sob a escuridão da noite, chegaria também o dono do castelo, que seria também seu noivo. O dono do castelo era um monstro. Então, à noite, Psiquê deveria deitar-se  na cama do monstro, para assim ser sua esposa; pela manhã, ela deveria deitar-se na mesa, pois ela seria o café da manhã desse terrível esposo.

Apesar da natureza trágica desses acontecimentos por vir, Psiquê  não pensou em escapar , pois isso era impossível. Àquela época, os gregos acreditavam que a vida de cada um era governada pelo Destino, do primeiro ao último instante da vida. Por isso, a Alma aceitou seu Destino. No dia seguinte, ela rumou sozinha para o encontro com a morte.

Ao entrar no castelo, cuja porta estava aberta, Psiquê não encontrou ninguém em seu interior. Então, ela subiu até ao quarto para arrumar-se para aquela que seria , ao mesmo tempo, a sua primeira noite como esposa e a sua última noite de vida.

Quando veio a noite, a Alma deitou-se no leito, e passou a aguardar, conformada,  o noivo-monstro. A janela estava aberta, como se fosse uma pálpebra. Através dela, podia-se ver  a lua imensa a observar o quarto . Uma súbita brisa entrou pela janela e rodeou a Alma suavemente. Mas aquela não era uma brisa comum. Como se tivesse braços, a brisa envolveu a Alma, e  a apertou vagarosamente. Então, como se adquirisse boca, a brisa soprou no ouvido da Alma as seguintes palavras: “Psiquê, só lhe peço uma coisa: confie em mim. Se você confiar, no fim será  feliz”. Após ouvir essas palavras, a Alma sentiu aquele abraço invisível apertar cada vez mais. O abraço provocava na Alma sensações  nunca antes por ela sentidas, sensações de prazer e satisfação. Por fim, a Alma  perdeu os sentidos, mergulhada que estava em um transe nunca por ela vivido.

Ao acordar  pela manhã, Psiquê se viu sozinha na cama. Contudo, o lençol ao seu lado estava amarrotado, como se alguém tivesse dormido ao seu lado. E o mais importante: o monstro não havia aparecido.

Na noite seguinte, a Alma repetiu o mesmo comportamento da noite anterior, e se pôs a esperar  a morte. Todavia, novamente a brisa entrou pela janela e a envolveu. A última coisa que a Alma viu antes de desfalecer de novo foi, através da janela, a lua a lhe sorrir.

Na manhã seguinte, o mesmo fato da manhã anterior: o lençol amarrotado indicava que alguém dormira com Psiquê, mas partira bem cedo. Quando veio a noite, novamente o mistério se apoderou da Alma, e com ela dormiu. Pela manhã, ninguém...Isso se repetiu por noites e manhãs seguidas.... e nada de a morte vir para  devorar a Alma. 

Certa vez, no meio da tarde, bateram à porta do castelo. Eram as irmãs de Psiquê: a Desconfiança e a Dúvida. Estas ficaram surpresas ao verem a Alma ainda viva. E mais surpresa lhes causou a alegria estampada no rosto da Alma. De imediato, as irmãs de Psiquê pediram para que esta lhes contasse o que afinal aconteceu e, principalmente, qual o motivo de toda aquela felicidade que a Alma  não conseguia esconder, embora tentasse.

Enquanto ouviam a história, as irmãs de Psiquê começaram a se sentir incomodadas com aquela felicidade da irmã. Pois parecia que a Alma havia experimentado algo que elas, mesmo sendo casadas, nunca experimentaram.

Então, a  Desconfiança  se aproximou da Alma e lhe dirigiu palavras que visavam pôr aquela felicidade da Alma em suspenso. A Dúvida, por sua vez, aproveitando-se de seu poder sobre a Alma , disse-lhe para descumprir o prometido, e ver quem era de fato aquele ser que lhe visitava todas as noites.   Descontrolada  pela influência da  Desconfiança e da Dúvida, a Alma ficou insegura de si e do que sentia . Por fim ,ela perdeu  sua capacidade de acreditar. Com isso,   foi-se embora  a felicidade que nascera dentro dela. 

Antes de partirem, as irmãs de Psiquê lhe deixaram uma vela que tinha poderes especiais, pois tal vela podia iluminar o invisível. Naquela noite, novamente se repetiu a visita do mistério . Mas, dessa vez, Psiquê tinha um plano. Ela esforçou-se para não desfalecer como das outras vezes, ficando a fingir que dormia. Antes de o dia amanhecer, ela acendeu a vela e a aproximou lentamente do ser que dormia ao seu lado ainda. Pouco a pouco, a luz foi tirando da penumbra o ser misterioso que nela se ocultava. Quando viu por completo o ser que o mistério escondia, a Alma ficou maravilhada, pois nunca ela havia visto ser tão singular e indescritível em palavras, a não ser quando as palavras se metamorfoseiam em poesia. Pois ao seu lado estava nada mais nada menos do que o próprio Amor[2]. O Amor havia amado a Alma durante todas aquelas noites. Foi o Amor então que a fizera feliz, como nunca ela havia sido. Naquele dia no Oráculo, foi o próprio Amor que, ocultando-se ainda, falou à Alma, querendo ser desta o destino.

Contudo, tão absorta a Alma se encontrava, que ela não reparara que a cera da vela estava prestes a pingar. Um pingo quente escapou da vela, e caiu sobre o corpo do Amor,  acordando-o de súbito. Sentindo-se traído, o Amor  levantou-se rapidamente do leito. Ao puxar as flechas que pendiam sobre a cama, uma delas feriu a Alma. Tais flechas eram usadas pelo Amor como instrumento para que alguém, por intermédio delas, se apaixonasse por outrem. Todavia, como a Alma estava olhando para o Amor quando foi ferida, era pelo Amor então que a Alma passou a ter amor. O amor do Amor abrigou-se no coração da Alma, e isso a tornava ainda mais bela. Contudo, antes de partir, Eros lhe disse: “ Psiquê, somente um pedido eu lhe fiz, mas você não foi capaz de cumpri-lo. Sem confiança não há amor.”

Feliz por ter encontrado o Amor, mas ao mesmo tempo infeliz por tê-lo perdido por não confiar, a Alma viu-se sozinha no castelo. Porém, subitamente ela reparou que não estava de fato sozinha, pois o Amor se instalara em seu coração, e dele expulsou  a descrença. Mas este Amor no coração era apenas a semente que, para germinar, precisava encontrar o Amor no mundo. Então, a Alma saiu para o mundo, atrás do Amor que um dia teve, e que perdeu por dar ouvidos à  Desconfiança e à Dúvida.

A cada um que encontrava pelo caminho, Psiquê perguntava se em algum lugar esta pessoa viu o Amor ou se sabia onde ele estava. Para sua surpresa, poucos confessavam que o haviam visto, e muitos outros diziam que ele não existia . Dentre aqueles poucos que o haviam visto, um dizia que o Amor se chamava Carmem; outro confessava que, no passado, teve um Amor   chamado Ana; uma outra dizia que o Amor, para ela, atendia por Pedro. Ou seja, cada um havia visto o Amor numa pessoa. Mas a Alma procurava pelo Amor cujo nome é, apenas, Amor: o Amor puro ― que é, ao mesmo tempo, o mais singular e  o mais universal.

Por fim, Psiquê resolveu pedir o auxílio dos deuses. Para seu infortúnio, a primeira divindade que ela encontrou foi exatamente Afrodite. Escondendo de Psiquê a inimizade que por ela sentia, Afrodite fingiu sofrer com o padecimento da Alma, e disse saber como acabar com aquele tormento. Mas o que Psiquê não sabia, e nem desconfiava, é que aquilo tudo era fingimento de Afrodite. Na verdade, a deusa  queria aproveitar o sofrimento de sua rival para melhor derrotá-la.

Valendo-se da situação, Afrodite resolveu vingar-se com uma mentira, e disse a Psiquê que esta somente teria o Amor de volta se fizesse inúmeras tarefas arriscadas e cansativas.  Psiquê, no entanto, disse-lhe que não mediria esforços para ter o Amor de volta. Assim, Psiquê caía na armadilha de Afrodite. Esta acreditava que o cumprimento de tarefas tão desgastantes findaria com a beleza da Alma. Como consequência, a Alma ficaria feia e acabada, e o Amor nunca mais olharia para ela.

Contudo, embora se dedicasse com afinco às penosas tarefas, a Alma nunca  se enfeava. Uma das tarefas penosas era ir a uma praia imensa e separar os grãos escuros dos claros. Na hora, porém, apareceram milhares de formigas que vieram auxiliar na tarefa. Quando a alma se sacrifica para buscar o afeto que a potencializa, a natureza inteira se solidariza e não a deixa sozinha, por mais que ela pense estar.  Assim, o sacrifício pelo Amor, ao invés de a enfear e cansar, a tornava ainda mais viva e bela.

Enfim, vendo o Amor que a Alma o buscava mais do que a tudo, ele resolveu não se esconder mais, e mandou seu irmão ir até à Alma para dizer-lhe onde ele se encontrava. O irmão do Amor é o Perdão. O Perdão disse à Alma que o Amor se encontrava escondido dentro dela.

O Amor quis então que ele e a Alma nunca mais se separassem. Para isso, seria preciso que a Alma nunca morresse. Era preciso que a Alma também se tornasse divina. Com esse intuito, o Amor procurou a Zeus, o deus da Justiça, e pediu-lhe para que ele imortalizasse a Alma, tornando-a divina. Zeus disse então à Alma: "Aparentemente, parece fácil, em palavras, conquistar a imortalidade, porém é a coisa mais difícil na prática!...Se os homens fizessem na prática o que fazem com as palavras, o Olimpo estaria repleto de homens... ". Então Zeus diz o que é preciso a Alma fazer para se imortalizar: "Basta apenas estar sempre na companhia do Amor, nunca dele se afastar, não importa onde e quando. Eis o mistério maior da alma: embora mortal, a alma se imortaliza quando ama."

Para os gregos, assim como para os romanos, o amor era uma força cósmica, e não uma dimensão meramente subjetiva ou romântica. Nesse sentido, quando a alma ama, ela age, transforma, educa-se, aprende e ensina. Creio que é nesse sentido que podemos interpretar este verso de Manoel de Barros: “Se a gente não der o amor, ele apodrece dentro de nós.”

 

 

 

 

 




 

[1] “Psiquê” está na raiz de “psicologia”, que é o “estudo da alma”.

[2] Sem que Psiquê desconfiasse, foi o Amor que, tomando o lugar do deus Apolo, falou com Psiquê através do Oráculo. O intuito do Amor era, no tempo oportuno, revelar-se à Alma. Por isso, ele inventou a história do monstro.

 

 

Estes livros são apenas sugestões de leitura para quem quiser saber mais:

                           

 

( o mito de Eros & Psiquê possui várias versões narradas por Homero, Hesíodo, Platão, Ovídio , Plotino, La Fontaine, Fernando Pessoa...O livro acima apresenta a versão do poeta latino Apuleio, que muito influenciou Freud e Lacan).

 

 

 

Texto preto sobre fundo branco

Descrição gerada automaticamente

Outra referência fundamental, na qual sempre me apoio quando explico o mito de Psiquê e suas diversas implicações com a cultura grega, é este livro de Rohde (infelizmente, o livro ainda não foi traduzido para o português). 

 

 

Interface gráfica do usuário, Aplicativo

Descrição gerada automaticamente

(Há ainda esta versão do mito interpretada pelo poeta Fernando Pessoa)

 

Imagem digital fictícia de personagem de desenho animado

O conteúdo gerado por IA pode estar incorreto.

( “O nascimento de Vênus”/ Botticelli)



                                O EROS DE PLOTINO[2]

 

Eros primeiro amou Afrodite, achando que Afrodite era tudo; até que Eros conheceu Psiquê, esquecendo de imediato Afrodite.

No início, Eros foi só de Afrodite; depois esqueceu Afrodite e passou a ser só de Psiquê. Com isso, Eros produziu tristeza em Afrodite, ao mesmo tempo que mantinha Psiquê ignorante de que ele já havia amado, e muito, um outro ser.

 Por isso, Eros fazia de tudo para que Afrodite e Psiquê se ignorassem, como se a alegria de uma fosse a dor da outra, de tal maneira que a felicidade de ambas ele não poderia oferecer.

Na mitologia, Eros é o Amor, Afrodite simboliza o Corpo, enquanto Psiquê é a Alma.  Assim, os gregos achavam que o Amor não pode amar, ao mesmo tempo, o Corpo e a Alma.

O Corpo proporciona prazer ao Amor, ao passo que a Alma lhe faz nascer a Sabedoria (Sophia). “Prazer” em grego é “hedon”, de onde nasce “hedonismo”. Entregar-se ao Hedonismo ou buscar a Sabedoria:  essa escolha deve ser, segundo os gregos, a decisão que a parte de nós que ama deve fazer.

Platão, por exemplo, fez da escolha exclusiva do Amor pela Alma a base de sua filosofia, ao mesmo tempo condenando o Corpo como não tendo, para o pensar, nenhuma serventia. Para Platão, filosofar é aprender a morrer.

Plotino não concordava com essa visão dicotômica, nisso inspirando Espinosa. Segundo Plotino, a função maior do Eros-Amor-Cupido, a sua utilidade suprema, não é escolher entre a Alma e o Corpo, mas fazer a Alma e o Corpo unirem-se um ao outro para viverem o ato de pensar como paixão pelo viver.

Em Plotino, assim como em Espinosa, o amor não é um sentimento meramente subjetivo ou romântico. Segundo sua etimologia poética, “amor” nasce da união da letra “a” com função restritiva (como em “a-fasia”: “não fala”) mais a abreviação da palavra morte ( por razões de métrica, às vezes os poetas latinos escreviam “mor” em vez de “morte”). Assim, em seu sentido originário, “amor” é “não morte”, nos vários sentidos que a morte pode ter.

Amar a educação, por exemplo, é agir pela não morte dela (o projeto de escola militar-fundament4lista representa a morte da educação); amar a vida digna, tanto a pessoal quanto a coletiva, é agir pela não morte da democracia (o autorit4rismo político é a morte da vida digna).

Cupido não portava apenas uma flecha para atingir os corações, ele também carregava uma tocha:  para incendiar com o lume da paixão transformadora as ideias e as ações. É uma paixão assim a base da educação libertadora: “Só desperta a paixão de aprender quem tem a paixão de ensinar.” (Paulo Freire)

Esse amor-paixão, antídoto contra toda forma de morte, também o ensina o poeta Manoel de Barros, que afirma: “Se a gente não der o amor ele apodrece dentro de nós.”


Sobre que asas se atreveu a ascender? 

( W. Blake)

 

(este livro de Clarice é apenas uma sugestão)


 

Texto

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[1] Texto-aula elaborado pelo prof. Elton Luiz. Este texto é uma versão de um capítulo de livro que escrevi.

[2] Texto elaborado pelo Prof. Elton luiz.




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