No livro “1984”,
 George Orwell mostra que  um  poder t1rano não se mantém apenas com a violência
física, ele também se serve da violência simbólica : apagando  certas palavras  do uso público para assim tentar eliminar  também da realidade seu sentido e prática. 
Parece estar
acontecendo isso com a palavra “trabalhador”, que o poder do Capital tenta
apagar colocando no lugar “colaborador” ,isto é,  colaborador do
Capital .
Quando a França
foi ocupada pelos n4zistas, eram chamados de “colaboradores” os franceses que ,
de forma submissa, faziam o que os dominadores n4zistas mandavam. 
Não por acaso, o
nome “colaborador” nasceu da boca dos patrões para designar o trabalhador que
não se envolvia com sindicatos, greves, luta por direitos... “Colaborador” é,
na visão do Capital, o “trabalhador homem de bem”. 
No dia de hoje,  O Globo e Folha falam em   “Dia do
Trabalho” , que é algo vazio, abstrato, “sem gente dentro”,  diria o poeta Manoel de Barros. O curioso é
que em outras datas comemorativas eles não dizem “Dia da Medicina”, mas “Dia do
Médico”, ou “Dia da Advocacia”, e sim “Dia do Advogado”, ou ainda “Dia do
Ensino”, mas “Dia do Professor”. Por que no dia de hoje  a mídia corporativa tenta esconder aquele que  exerce o trabalho?  
Além disso,
médico, advogado , professor também são trabalhadores: cada atividade é
exercida para produzir saúde, justiça, conhecimento...Pode-se, claro, com elas
ganhar dinheiro, porém o dinheiro assim ganho vem do trabalho, da produtividade
com coisas reais. O Capital, ao contrário, não trabalha: ele explora quem
trabalha.  
Uma das palavras
mais bonitas em grego é “eudaimonia”. No coração dessa palavra está o nome
“Daimon”, pois “eudaimonia” é : “estar na companhia de um bom Daimon”.  Em
português,  “eudaimonia” é   “felicidade”. 
Para os gregos, assim como para nossos indígenas, a felicidade não é propriedade egoica de um indivíduo, a felicidade é agenciamento coletivo: impossível o indivíduo ser feliz se a pólis está triste, tampouco pode o indivíduo ter saúde com a pólis doente.
O Daimon é
aquele que, fazendo-nos companhia, ajuda nas travessias. Mas o Daimon só nos
faz companhia se aprendermos a ser companhia. 
“Companhia” vem
de “com-pane”. E “pane” é, em português, “pão”. Assim, fazer companhia
é  saber “dividir o pão”. Companheiros: “aqueles que dividem o pão”. 
Há o pão que
alimenta o corpo: quando esse falta, vem a fome.  Quando um povo não aceita  ser
rebanho de tir4nos,  nasce nele    a fome por
outro pão: o pão da dignidade e da justiça, pão que  tem o fermento
da arte, da educação e da poesia,   pão que alimenta a luta. 
 Creio que “colaborador”
e “empreendedor” são termos que propagam a ideologia  de que o outro não é um companheiro, mas um
“competidor”. 
Mas ser
trabalhador  é saber-se companheiro das
lutas comuns de todo trabalhador pela conquista e partilha dos dois pães: o que
alimenta o corpo e o que nutre/liberta o espírito.

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