sexta-feira, 24 de fevereiro de 2023

a hedionda guerra

 

Kant foi um dos principais   Iluministas. O Iluminismo  acreditava que a Razão é uma Luz que destrói as trevas : o Direito, enquanto fruto dessa Luz  , é antídoto contra as trevas da força bruta; a Cultura, também fruto da Razão, é meio para se vencer as trevas da inumanidade; o Conhecimento, fruto maior da Luz da Razão, é arma para se vencer as piores trevas: as da ignorância( em suas formas variadas ) .

Enfim, o Iluminismo acreditava  que a Razão ,  e somente ela, garantiria o progresso do homem e das sociedades. E que a História seria o palco desse “progresso”.

Kant expôs essas ideias no livro “À paz perpétua”, obra que influenciou a criação da ONU após a hedionda Segunda Guerra Mundial.

Contudo,  o grande desafio dos Iluministas era explicar a guerra: como justificar  tal monstruosidade da perspectiva “racional”?

Kant se vale então de uma imagem: não só os “espertos” têm astúcia, a Razão também tem sua própria “astúcia”. A “astúcia da Razão” se revela quando ela se vale de meios aparentemente pouco racionais para realizar  seus objetivos. Até mesmo na guerra a Razão encontra um meio para prevalecer, pensava Kant.

Este é o argumento de Kant: num primeiro momento,  as  guerras dispersam os homens sobre a superfície da terra. Como a terra é finita, chega um momento no qual não é mais possível fugir. Então, para  sobreviverem os homens são obrigados a fazerem pactos e contratos, isto é , serem racionais.

São esses pactos que , além de trazerem a paz, tornam possível depois  o comércio dos povos, incrementando assim o progresso, que é o fim buscado pela própria Razão. Desse modo, a “Razão Astuta”  encontra até mesmo no ódio e na  guerra um meio para realizar seus fins.

Porém, na época de  Kant  as guerras eram travadas  com canhões apenas . E o planeta terra , nossa Mãe Arquetípica, era somente  o palco das guerras.

Kant talvez tenha superestimado a Razão, ou então subestimado o tamanho das trevas que se esconde dentro da alma sombria de certos homens, sobretudo os ávidos por poder e destruição.

Se Kant tivesse dimensionado adequadamente , creio que ele não diria que  guerra e ódio  podem estar a serviço da humanidade. Ao contrário, a guerra dos homens serve exclusivamente à destruição sem a menor “astúcia”, uma destruição bruta mesmo, expressão visível de uma “pulsão de morte”  antivida.

Nas guerras que Kant presenciou, nosso planeta  em sua imensidão oferecia abrigo e proteção aos vitimados pela  bestialidade niilista dos homens.  Porém a treva hoje é tamanha, que a própria Mãe-Terra  corre riscos  diante da treva da ignorância armada com mísseis abomináveis.

Por isso, preferimos Espinosa ao ensinar que o pensamento realmente emancipador  nunca é “astuto” : o que é  libertário se  mostra sobretudo nos meios que emprega para afirmar a si mesmo. É  afirmando a si mesma que a luz fica mais potente e pode vencer  as trevas, e nunca  fazendo das trevas  do ódio um meio.




 



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