Quero escrever movimento puro.
Clarice Lispector
É verdade que, no caminho que leva ao que cabe pensar,
tudo parte da sensibilidade.
Gilles Deleuze
É verdade que, no caminho que leva ao que cabe pensar,
tudo parte da sensibilidade.
Gilles Deleuze
Não é a coisa limitada que impõe um limite ao infinito;
é o limite que torna possível uma coisa limitada.
Todo limite é ilusório, e toda determinação é negação,
se a determinação não está numa relação imediata com o indeterminado.
se a determinação não está numa relação imediata com o indeterminado.
Gilles Deleuze
Chega de teorias, de promessas de ser. Não escreverei mais,
não mais falarei; vou fazer, construir, inventar. Não quero mais contemplar,
nem figurar mundos possíveis. Quero apenas uma matéria, uma vida para modelar:
serei o barro, o metal, a matéria...Mas também serei o artista, o artesão, as
ferramentas, as cores e a singular perspectiva.Vou esculpir a mim mesmo, serei minha obra a inventar.
Não a farei segundo cânones ou técnicas, tampouco de acordo com regras desta ou daquela escola. Simplesmente
me farei, me inventarei, me esculpirei. Será a mão quem me fará. Retirarei dela
anéis, alianças, unhas...A quero nua, criança.
Ela então começa...Esculpe meu detalhe, meu contorno e espaços,
de dentro e de fora. Esculpe meus pensamentos novos, meus desejos que nascem
agora. Ela esculpe meu coração e o que nele sente. Ela vai esculpindo, sem
projeto, sem a priori, sem expectativas. Ela apenas esculpe, cria, inventa,
faz. Eu não antes era, tampouco serei. Sou todo agora, e este agora é processo,
fazer-se.
Falta pouco, quase nada. A mão já esculpiu o braço , o antebraço,
o punho...Falta agora somente mais uma coisa para ela me concluir: falta minha
mão esculpir minha mão. Falta ela esculpir a si própria. Resta o produtor
coincidir com o produto, resta o artista ser a própria obra.
A mão então se contorce, tenta alcançar seu ser, que no
entanto escapa. Não adianta virar do avesso, pois criar uma vida nova não é
virar uma vida antiga pelo avesso. Então, a mão para, estanca, treme, parece ter chegado a um limite.É nesse momento que o pensamento vem tomar-lhe o lugar . Ele que ali ,
no entanto, sempre estivera. Pois o pensamento é a mão da mão, ele é o fazer que
pensa. Assim, sabendo-me rascunho, obra se fazendo, anexata, liberto-me de toda vontade de ser obra acabada.
Não basta apenas a diferença por oposição a uma identidade
rígida, oca, neurótica.É preciso “fazer a diferença” ( Deleuze). Só há diferença quando feita, arriscada, ousada, instaurada. A diferença que não faz diferença não é diferença, é mera oposição, reação, impotência.A diferença, quando faz diferença, inventa a si própria como acontecimento novo, que para ser compreendido requer também um modo de conhecer e perceber diferentes.A diferença não é algo que se
encontra pronto, muito menos se acha codificada em uma cartilha ou receita.Não se sabe o
que é fazer diferença a não ser quando ela é feita. O conhecimento da diferença
vem depois de ela mesmo ter sido feita, pois a diferença é exatamente aquilo que
não se conhece antes dela, não se pode conhecê-la de forma a priori.Ao ser feita, a diferença também faz o conhecimento que se tem dela, conhecimento este também diferente, novo.Como fazer a diferença? Repetindo-a. Por isso, a
diferença é inseparável da experiência com ela própria. Em tudo aquilo que fez diferença há um aprendizado: repetir não o que se fez, mas repetir a diferença , que somente no novo se pode fazer.E qual é essa diferença? Invente-a.É do fazer a diferença
que nasce um estilo. O estilo é uma harmonia na diferença, uma harmonia nada domesticada , uma harmonia selvagem, como os solos de uma alma livre, que sabe que todo solo somente é possível quando agenciada.
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