quarta-feira, 4 de agosto de 2021

Espinosa e o poder teológico-político

 

Espinosa dizia que há uma espécie de “trindade obscurantista” que reduz os homens e as sociedades ao pior deles mesmos, pondo em risco a pluralidade social , a educação e a democracia. Essa trindade é composta pelos seguintes personagens ou tipos: o escravo, o tirano e o sacerdote.

O escravo é aquele que se deixa dominar pelas “paixões tristes”. O escravo não apenas as sofre, o que é natural de acontecer tendo em vista a condição humana, porém ele se alimenta delas, como se isso preenchesse algum buraco em sua vida. O ódio, a ignorância, o medo, etc., são exemplos de paixões tristes. Se uma serpente nos morde, é inevitável que em nós entre o veneno, cabendo-nos imediatamente buscar o antídoto. Mas a paixão triste pode fazer do homem um dependente do veneno que o enfraquece , ao mesmo tempo maldizendo quem traz antídotos.

O tirano é quem se vale das paixões tristes para dominar os ressentidos e ignorantes. O tirano canaliza as paixões tristes e as emprega a seu favor, inclusive politicamente. O tirano chega ao poder não por amor à coisa pública, mas tirando proveito das paixões tristes e as fazendo de arma contra os que ele estigmatiza como inimigos.

O sacerdote é aquele que passa a mão sobre a cabeça do escravo, bendizendo a ignorância . Em geral, os sacerdotes são pequenos, e só ficam maiores do que os escravos os mantendo ajoelhados. O sacerdote prega que a tristeza é melhor do que a alegria, que o obedecer é melhor do que o rebelar-se, que filosofia, ciência e arte são perigosas. O tirano escraviza o corpo do escravo, o sacerdote escraviza a alma. “Sacerdote”, aqui, não é exatamente uma autoridade religiosa literal, mas um tipo que se aplica a várias espécies de homens que extraem sua força cultivando a fraqueza nos outros.

Espinosa chama de poder teológico-político a essa aliança abominável entre tiranos e sacerdotes, cuja força cresce quanto mais o escravo ignora sua escravidão e é dominado.

Como um médico, Espinosa não  aponta apenas para a doença, ele também oferece o remédio - remédio que, em primeiro lugar , ele aplicou em si mesmo , para que em suas palavras possamos achar um  antídoto que nos dê força para pensar e agir  ante a barbárie.    

Esse antídoto aumenta sua força quanto mais é partilhado , não sem perseverança,  alegria e amor libertário. Esse antídoto   tem um nome: filosofia prática.




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