Segundo o poeta-pensador Manoel de
Barros, a poesia libertária que afeta e faz pensar é sempre “delírio ôntico”. A palavra “delírio” vem de “de-lira”: "fora
da lira".
Na Grécia, a palavra “lira” designava
, ao mesmo tempo, o nome do instrumento musical tocado por Orfeu, o poeta
originário, e também os sulcos paralelos feitos na terra para se plantar uma
semente. Os sulcos paralelos na terra lembram as cordas paralelas da lira.
Porém, há dois tipos de delírio: o
mórbido-destrutivo-doentio e o poético-criativo-pensante.
Quem delira morbidamente , como no
delírio autoritário por poder, lança suas ideias e palavras fora da lira, fora
dos sulcos : nada germina de tais palavras e ideias. É por isso que delirantes
assim recorrem à violência, física ou simbólica, para tentarem se impor.
Mas com o delírio poético-criativo-pensante
é diferente : às vezes , um
criador-pensador cria uma ideia-semente tão nova e potente que ela não cabe nos
sulcos antigos, sendo necessário criar novos sulcos para a ideia-semente nova ser
lançada e cuidada , tal como uma sinapse-sulco nova na qual germinará um pensar novo que
educa , emancipa e horizonta a mente.
Em grego, "on" é "ser" ( de onde nasce
"ontologia": “estudo do ser”).
Assim, o "delírio ôntico", ao contrário do delírio mórbido, é prática
poética-filosófica de criar novos sentidos para o viver.
"O Chapeleiro:
- Estou com medo, Alice. Não gosto daqui!
Minha cabeça está cheia... Será que sou louco?
Alice:
- Receio que sim, você é louquinho...
Mas vou lhe contar um segredo: as melhores pessoas são."
(Trecho de “Alice no país das maravilhas”, fruto dos delírios
ônticos de Lewis Carroll)
( Perdoem-me citar a mim mesmo através do livro que acompanha a postagem, juro que não é
narcisismo...rs...É que a capa expressa , por imagem, o que tentei dizer no texto da postagem: espinosisticamente perseverante, a vida sempre acha um sulco
improvável por onde germinar , mesmo
onde parecia impossível, tal como a
folhinha-broto produzindo sua “linha de fuga” através da fenda)
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