quarta-feira, 10 de julho de 2019

pindorama

Ela se chamava Maria Madalena. Nasceu na Nova Holanda, de pai desconhecido. Aos 13 ficou grávida do traficante do lugar. Mas pouco viveu o recém-nascido,  morrendo antes que soubesse andar.
Aos 15 foi viver na rua, virando a puta de muitos que só a queriam usar: seguranças, policiais, agentes sociais...vários a exploravam muito sob a máscara de fingir ajudar.
Aos 18 ela parecia ter 50: enquanto a distraíam etílicos sonhos, vinha o tempo feito um ladrão roubar seus anos, sem dó , sem pena.
Padres, pastores, pais de santo, ungidos...Todos diziam que a poderiam recuperar.
Um chegou a  dizer que sua vida era castigo,culpa de outra vida, karma a lhe pesar.
Maria Madalena pegou de novo barriga, de novo a perdeu.Seu corpo era todo ferida,mas lhe doía mais a alma que enlouqueceu.                                    
Numa fria madrugada,ela caiu junto a um ipê perto da Lapa,entre sacos de lixo e urina de cão.
Ela caiu perto da raiz,e só a aurora testemunhou sua desaparição.
O ipê a sorveu para dentro de si, a limpou de toda sujeira humana, secou-lhe toda ferida insana, a alimentou com seiva até dormir.
Hoje , Madalena virou beleza que o ipê ao céu fez florir.

(a flor do ipê é uma das poucas que floresce colorida resistindo ao  cinza do inverno. Por poder  ser explorada comercialmente, os brancos colonizadores  escolheram o pau-brasil como árvore do Brasil , mas para os índios que aqui viviam era o ipê a árvore que protegia e curava Pindorama)


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