segunda-feira, 13 de janeiro de 2014

manoel de barros: agenciamento, intercessor , "outsider" ( trecho do livro)






Encontra-se em Gilles Deleuze as coordenadas de uma filosofia do agenciamento, uma filosofia do aprender a andar ao lado de nossos intercessores.
Curiosamente, a expressão “intercessor” remonta à Bíblia, e designa aquele que “abre as portas do céu”. Um céu que não é apenas exterior, mas também interior. Em Deleuze, o Céu é uma das imagens da Terra. E o intercessor que nos leva a ela pode ser inúmeras coisas: não apenas um livro de filosofia, uma música, um poema, enfim, uma obra de arte também podem sê-lo com a condição de aprendermos a andar ao lado desses intercessores, com as pernas de nosso pensamento e de nossa sensibilidade.
                                                                                                                               
[Um intercessor não nasce da intercessão de opiniões idênticas ou semelhantes, mas do produzir singularmente uma área de afeto onde não se diz mais "eu" ou "outro": ousa-se dizer um "nós", mesmo que ainda em balbucio ou gaguejando.Um nós não nasce da intercessão de conjuntos com contornos delimitados, pois o intercessor é um "outsider", um "lado de fora" que incorporamos lá onde deveria estar um contorno, para assim inventarmos limiares.O "lado de fora" não é um fora que se opõe a um dentro, mas abertura para o fora que se faz de dentro, encontrando um intercessor . Um intercessor é "aquele que intercede a nosso favor". Mas intercede em relação a quais assuntos e diante de quem?Os assuntos que pedem intercessores são sempre aqueles verdadeiramente essenciais para que nós possamos , como dizia Nietzsche, "nos tornar nós mesmos".O intercessor intercede por nós diante da vida, diante do cosmos, diante daquilo que não podemos conhecer; ele é mão estendida que sempre puxa para cima: não exatamente para cima de um palco ou de um pódio, mas para um ponto onde nos distanciamos de nós mesmos, para assim aumentar nosso horizonte e perspectiva. Ele intercede sobretudo diante de nós mesmos, tornando-se a ponte entre nós e aquilo que verdadeiramente somos. Contudo, um intercessor não existe com uma etiqueta nos avisando:"Eu sou seu intercessor". Não raro, o intercessor está imperceptível aos olhos daqueles que olham mais para os outros do que para si : embora o intercessor possa estar maduro para eles, são eles que ainda não estão maduros para encontrar o intercessor. De certa maneira, somos nós mesmos que produzimos nossos intercessores quando,ativa e singularmente, desejamos produzir a nós mesmos, fato este que expressa não apenas discernimento e virtude, mas também arte ]









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