sexta-feira, 15 de fevereiro de 2019

os fluxos


                                                                A cisterna contém; a fonte transborda.
                                                                                    (William Blake)

No livro "O guardador de águas", Manoel diz que aprendeu  a guardar águas. Não ouro, dinheiro ou posses, mas águas. Guardar também é cuidar. As águas não são exatamente coisas, elas são fluxos. Cuidar dos fluxos é o oposto de construir cercas ,  gaiolas , gramáticas. Os fluxos são sempre desterritorializados e desterritorializantes : não se pode "passar régua" neles . Para guardar fluxos é preciso também  ser um. Ser fluxo não é ser “líquido”. Os líquidos são “voláteis” ( como a liquidez do Capital destes “tempos líquidos”...). Os fluxos correm entre as pedras , e nunca se submetem ao poder delas , vencidos.  O líquido é um estado contrário ao sólido, que nega o sólido; assim como o sólido, enquanto estado, também é uma negação do líquido. Apesar de opostos, sólido e líquido são estados, isto é , enfraquecimento ou despotencialização do fluxo: por enrijecimento de uma identidade , no caso do sólido; por tornar a diferença um clichê , no caso do líquido. Os fluxos não são estados :  eles são devires...
 O líquido se acostuma parado, se o  aprisiona   uma  cisterna. Mas um fluxo é feito o sangue nas veias:  se não   avançar, perece.  Os fluxos ou inventam linhas de fuga ou secam e morrem -  e a secar resistem com toda força que podem.
 Os fluxos somente podem ser guardados em espaços  abertos. E abertos se tornam a sociedade, a mente e o afeto se um fluxo de vida os atravessa. O fluxo é fluido, mas não é sem força ou volúvel; ele é firme, possui consistência, porém não é rígido. Pedras não  vencem o  avançar de um fluxo ,  enquanto viver a fonte da qual ele transborda.


                                                                                                                              



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