O excelente e imperdível novo documentário de
Petra Costa me fez lembrar o livro “Tratado teológico-político” , de Espinosa.
No livro, o filósofo descreve o fenômeno da “credulidade”. No fundo
de toda credulidade vigora o medo. Não o
medo que pode nascer em quem enfrenta reais perigos, mas o medo ressentido que
prostra e cega. O que Espinosa descreveu em palavras, Petra mostrou em som e imagens.
Segundo Espinosa, é o medo o sentimento que melhor define a condição de servo
voluntário.
“Credulidade” não é a mesma coisa
que “fé”. A autêntica fé não nega a ciência, já a credulidade é neg4cionista do
conhecimento.
A fé é movida
pelo amor, mas é o ódi0 o combustível da credulidade. A fé busca a
justiça e age em favor dos pobres , a credulidade troca a cruz por arm4s e faz da
religião um vil negócio. A fé almeja alcançar Deus, a credulidade em tudo vê o
“Diabo”.
A credulidade se traveste de religião,
mas é na verdade projeto de poder obscur4ntista :
poder teológico-político.
A credulidade é rasa, rasteira: por não
conseguir alcançar a profundidade do sentido que há nos textos sagrados, ela
imagina que berrando e gritando se fará
ouvir pelo Espírito Santo.
A credulidade é produtora de
fantasia. Essa fantasia retroalimenta a credulidade, criando assim um
mundo paralelo à parte, mas que é visto pela credulidade como “Mundo Verdadeiro”. Não por acaso, a palavra
“Verdade” está sempre na boca delirante
da credulidade.
Fantasia não é a mesma coisa que
criatividade. As crianças nascem fantasiosas, porém nem todas conseguem
desenvolver a criatividade.
Quando a criança, movida pelo medo, imagina
haver um monstro debaixo da cama, o monstro
é produto de sua fantasia, embora a criança ignore isso.
Mas se a criança , ludicamente, cria uma história onde há um
monstro, ou simplesmente desenha um monstro e fabula uma narrativa , a criança
aprende que o monstro é criação de sua mente, de tal modo que, se ela o criou,
também o pode derrotar, criando igualmente o personagem corajoso que enfrentará e vencerá o monstro. Criança que assim brinca aprende a esconjurar o medo. O medo
apequena a mente, já a criatividade faz
a mente crescer e se horizontar.
Toda criança nasce fantasiosa, porém
para haver o despertar da criatividade é preciso criar meios socioeducacionais
que potencializem o imaginar pensante nas crianças.
Os tir4nos estão sempre perseguindo
os criativos e colocando “monstros”
debaixo da cama dos ignorantes, assim infantilizando, pelo medo, os homens.
Homens infantilizados são incapazes
de se autogovernarem, terminando por se
submeterem , pela credulidade, ao poder teológico-político acumpliciado
com tir4nos.
“Comunista”, “vermelho”... são os
“monstros” que o poder
teológico-político colocou debaixo da cama dos acorrentados à
credulidade , para assim ludibriá-los e
levá-los a crer delirantemente que um
mero ladrão de joias traidor da pátria é um “Messias” que irá salvá-los.
Esse poder teológico-político vem
perdendo força, seu “Messias” só engana hoje incautos incuráveis da
credulidade. Mas é preciso continuarmos atentos .
"Pessoas que se enquadram
cegamente no coletivo fazem de si mesmas meros objetos materiais, anulando-se
como sujeitos dotados de motivação própria. Inclui-se ai a postura de tratar os
outros como massa amorfa. Uma democracia não deve apenas funcionar, mas
sobretudo trabalhar o seu conceito, e para isso exige pessoas emancipadas.
Só é possível imaginar a
verdadeira democracia como uma sociedade de emancipados. A única concretização
efetiva da emancipação consiste em que aquelas poucas pessoas interessadas
nesta direção orientem toda a sua energia para que a educação seja uma educação
para a contestação e para a resistência". ( Trecho do livro Educação
e Emancipação, de Theodor Adorno)
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