Limpar da tela ainda branca os clichês que previamente a ocupam e impedem que sobre ela nasça de fato algo novo, singular;curar a mente das ideias confusas que encurtam toda visão. Quando tal clínica acontece, o que há para pintar e ver não é um outro mundo, mas este mesmo: o único mundo, simples e múltiplo, como o pintou Vermeer.
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Espinosa polia lentes.Antes de tudo, tal atividade expressava um paciente esforço nascido de um desejo aplicado sobre si mesmo. O que Espinosa desejava ver mediante a lente?Ora, Espinosa sabia que o ver não é uma atividade meramente passiva, que se apaga no objeto visto. Ver é uma atividade produtora do visto: "ver vendo-se" aumenta a compreensão de si mesmo naquilo que se vê, ao mesmo tempo que torna claro o que se vê quando este não é mais impedido de ser alcançado por uma lente opaca e turva.A lente é o olho do espírito. Este é polido pela prática de uma vida sábia, livre. A mão atua nesse trabalho de ampliação daquilo que o espírito pode tocar. Polir a lente é a atividade de autoconhecimento, de firme aperfeiçoamento. Através do que ele via, Espinosa queria ver a si mesmo vendo-se e diferenciando-se daquilo que ele via e que dependia dele ver.Ao ver vendo-se, Espinosa se compreendia como o visto de um outro Ver que era imanente ao seu próprio ver, uma vez que nada existe fora desse Ver como atividade de uma Luz em relação a qual nada se furta.Polir o nosso ver é desejar ver brotar nele o Ver que integra todo visto à sua atividade.Diante de tal Ver, nosso ver é ,também ele, um visto, isto é, um objeto que aumenta sua potência quando pacientemente lustrado e polido. O ver não nasce no visto, mas no instrumento de ver . Espinosa compreendida que seu ver não nascia nele, em seu ego, em sua pessoa; ele sabia que seu ver era instrumento de um Ver que tinha em sua imanência tudo o que pode ser visto.A clareza do que se vê depende da natureza da lente. Esta não é um mero vidro passivo,transparente; a lente do espírito é o espírito mesmo em sua atividade de ver, conhecer e compreender.Todavia, o visto não é inato ao ver, uma vez que o visto é o ver mesmo produzindo e desdobrando-se, para dentro e para fora, aumentando pelo meio.Ao invés da visão contemplativa do místico, o ver produtivo do artesão.
Etimologicamente, “idéia” significa , aproximadamente,“objeto visto”. Para termos ideias é preciso que tenhamos abertos os olhos, os olhos do espírito. Ao objeto visto precede um ver como atividade de pensar. O pensar não é o visto, ele é o abrir os olhos para ver; o pensar não é a idéia, ele é o produzir idéias. Nessa produção do visto, a idéia se descobre como sendo o afeto mesmo, porém apreendido de uma outra perspectiva. Então, já não somos dois, mas um só: o que o espírito vê, o corpo sente; o que o espírito sente, o corpo vê.
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Estende-se a paisagem sem pedir à natureza um limite:
nunca a pode conter a humana moldura que em nosso olho existe.
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