domingo, 6 de agosto de 2017

mística e política 2

O primeiro dos místicos, de todos o maior, foi Orfeu, o poeta. Orfeu tocava a lira, instrumento inventado por Hermes, do qual se apropriou Apolo , divindade da Luz , do Conhecimento e da Forma.  Orfeu tocava a lira, porém  também cantava. O canto é libertação do Pneuma, Sopro Vital. Em latim, "Pneuma" será traduzido por "Spiritus".
Os gregos de então achavam que o Pneuma  apenas se libertava na ocasião da morte, quando se separava do corpo. Mas Orfeu libertava o Pneuma , o Sopro da  Vida, por intermédio do canto, cantando a vida. Ao libertar a vida que estava nele, era a toda  vida que Orfeu libertava, comemorando a Vida.
Eram os dedos de Orfeu que tocavam a lira apolínea, porém às cordas vocais, lira íntima, quem as tocava era o próprio Spiritus, como Afeto que se imortalizava no som, na voz.
O instrumento musical de Dioniso era a flauta, instrumento de Sopro. A Luz de Dioniso é a luz noturna, luz da lua. O Conhecimento que advém de Dioniso é embriaguez com a Vida, mais do que com o vinho. E o que se vive assim não é Forma, mas Processo, Expressão, Transbordamento. Não um transbordamento como o da água que  se esvai do copo, e sim transbordamento feito o da Fonte que sai de si,porém  a si permanecendo ligada. Assim, Orfeu toca com as mãos o instrumento de Apolo , lira externa, ao mesmo tempo que dedilha com o Sopro Dionisíaco a lira íntima das cordas vocais, para libertar, produzindo,  o seu cantar.
Quando os homens ouviam Apolo tocando sua lira, era o Ceu  que tais sons faziam ver. Mas quando ouvem Orfeu tocando e cantando, era a Terra que era celestada, divinizando o simples viver. 

Originalmente, "místico" envolve a ideia de "unidade", o místico é aquele que busca viver uma unidade. O nome da esposa de Orfeu era "Eurídice". No entanto, "Eurídice" também era, àquela época, um dos nomes da alma, assim como Pneuma e Psiquê. Simbolicamente, era com Eurídice, a Alma,  que o poeta vivia uma unidade amorosa, poética, vital. É dessa experiência de unidade que nascia seu canto. Por isso, seu canto não era como o de Homero, canto épico e masculino, que cantava a história de guerras e conquistas do povo grego. O canto de Orfeu também não era como o de Simonides e Safos, canto lírico e feminino, que canta os mundos internos do eu. O canto de Orfeu, Canto Órfico, canta a unidade dos dois, do coletivo e do íntimo, do múltiplo e do um, do poder e do amor, inserindo-os no Cosmos Infinito que transmuta aquele poder, que amplia aquele amor. Um lirismo cósmico unido a  um povo múltiplo  no íntimo.








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