segunda-feira, 7 de novembro de 2022

sobre o "dar a outra face"

 

Como todos sabem, Cristo aconselhou mais ou menos o seguinte: “Se te baterem numa das faces, ofereça a outra”. Espinosa assim interpreta esse conselho :

Não se deve  interpretar esse conselho de forma descontextualizada . Segundo Espinosa, esse conselho levava em conta a situação política da época, na qual não havia Estado de Direito para proteger os perseguidos pelo  Estado-Totalitário de então.

Pois  a ideia de injustiça somente existe onde o Estado , enquanto instrumento legítimo de todos, busca realizar a justiça protegendo a sociedade. Para isso, é preciso que o Estado reconheça como cidadão aqueles que estão sob sua influência e ação. São as próprias noções  de cidadão e cidadania  que impõem um freio à ação do Estado, sobretudo de seu braço armado: o exército e as polícias.

Cristo aconselhou aqueles que o Estado tratava não como pessoas ou cidadãos, mas como seres  destituídos de dignidade e direitos, contra os quais as forças repressivas do Estado-Totalitário atuavam  como perversos carrascos .

Como poderiam os seres humanos daquela época enfrentarem tais  polícias e exércitos ? Esses tinham lanças, armaduras, escudos, cavalos, flechas, enfim, a força bruta armada, ao passo que os perseguidos por eles tinham apenas seu corpo.

Em casos assim, a violência das forças repressivas do Estado-Totalitário  é pior do que a injustiça: é a barbárie desumana fardada ( capaz até de transformar viatura policial em câmara de gás...).

Assim, segundo Espinosa, Cristo quis aconselhar acerca das estratégias que devemos ter ao resistirmos à barbárie da tirania sem sucumbirmos: o adequado é , por fora, aparentar não resistir , para dessa maneira melhor proteger a resistência interna e mantê-la viva.

Cristo não quis pregar aceitação passiva da violência, tampouco resignação covarde. Ele deu um conselho ético-político, uma regra de prudência prática, sobretudo quando o único bem que temos é nossa vida.

Segundo Espinosa, Cristo jamais daria o mesmo conselho  se à época vigorasse o Estado de Direito. Pois quando esse vigora ,  se alguém  fere uma de nossas faces devemos agir para proteger a integridade e dignidade  da outra face  , para  fazer nascer dela   a voz que denuncie o criminoso e conclame os justos a fazerem  juntos o coro que , com firmeza e coragem, não se cala diante dos criminosos e  suas ameaças.

Quando vigora o Estado de Direito, se alguém  nos fere uma das faces, tanto a face individual quanto a coletiva, isso é crime que deve ser punido , sem anistia.

 

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