Em seu sentido primeiro, “musa”
significa : “conhecimento que nasce das artes”. Os poetas-pensadores originários evocavam as Musas para auxiliá-los na tarefa
de manter sempre viva a lembrança do que nos potencializa e liberta.
Assim, o conhecimento que as Musas despertam não é só intelecto ou razão,
ele é também recordação enquanto “re-cordis”
: “trazer de novo ao coração” os afetos que fortalecem a vida. Quando a recordação
se torna ação, nasce a coragem :“força que vem do coração”.
As Musas são filhas de Zeus ,
divindade ligada à justiça e à ética, com Mnemósyne, Deusa da Memória. Mnemósyne
não simboliza a memória pessoal, mas a memória em sua dimensão social-histórica,
enquanto registro dos acontecimentos nos quais a vida triunfou sobre seus
carrascos.
Zeus uniu-se a Mnemósyne após uma luta vencida por ele e seus aliados contra as
forças da ignorância e da barbárie , tanto as
físicas como as simbólicas. Esse matrimônio era para co-memorar: “criar
memória” da vitória das ideias e valores sobre a força bruta.
Como a barbárie e a ignorância às vezes ressurgem do
bueiro onde se escondem , reaparecendo ao longo da história com nomes
diferentes (nazismo, fascismo, necropolítica, milicianato...), é preciso
manter viva a memória de que podemos vencer essas forças reativas do atraso,
pois dessa lembrança também depende a criação do nosso próprio futuro aqui e
agora, com coragem.
Segundo o poeta Manoel de Barros,
todo ato criativo é uma “imitagem". A imitagem não é um tornar-se mera
cópia passiva de um Modelo ou Padrão. Ao contrário, a imitagem é a produção de
uma diferença criativa.
Na singela foto , vemos a bailarina cujo
gesto foi imortalizado como escultura. Na menina, esse
gesto renasce e ganha vida, torna-se outro. A arte renasce em seu corpo, em seu
jeito: a criança interpreta, dançando, o que é dançar , reinventando o dançar à
sua maneira.
Em toda imitagem há a
aprendizagem da própria diferença que
se é. Diferença que autonomiza e singulariza nunca é negação do outro , mas a expressão de uma liberdade que
potencializa um agenciamento, um encontro.
Nesse encontro, a menina ao mesmo tempo aprende e ensina. Em sua
imitagem, é a menina, e não a escultura, a obra de maior arte.
Que a pequenina Musa, em sua
inocência brincativa, nos ajude a não esquecer o que precisa ser sempre
lembrado: que a vida é conhecimento , arte , coragem e liberdade, e que isso nos dê forças ante o
obscurantismo e a barbárie.
“Às vezes começa-se a brincar de pensar,
e eis que inesperadamente o brinquedo é que começa a brincar
conosco.”
( Clarice Lispector)
"Minha poesia não tem função explicativa, só brincativa."(Manoel de Barros)
"Nesta vida,
pode-se aprender três
coisas de uma criança:
estar sempre alegre,
nunca ficar inativo
e chorar com força por
tudo o que se quer."
(Leminski)
Um verso dessa música resumiria a estética do texto?
ResponderExcluir...entre os dentes, segura a primavera...