quinta-feira, 12 de novembro de 2020

paulinho da viola: 78

 

Li recentemente entrevista com o  grande Paulinho da Viola, que hoje faz 78 anos! Na entrevista, Paulinho responde  a um  jornalista acerca de seu modo de ser. Paulinho é reconhecidamente alguém modesto e simples, reservado mesmo, por vezes tímido no trato. Porém,  ele nada tem de tímido quando se trata de expressar, extroverter, a poesia através da música. Por outro lado, muitos cantores extrovertidos, que falam pelo cotovelo e atropelam seus entrevistadores, e que vivem a dar opinião medíocre acerca de tudo, tais cantores extrovertidos são impressionantemente introvertidos, tímidos, quando se trata de chegar perto, e conquistar, a poesia e a música! Se levarmos em conta essa  autêntica extroversão, Paulinho é extrovertido: “voltado  para” a alma plural  que lhe vai dentro, dele e de nós.

Essa alma plural é o que Paulinho  chama de “alma suburbana”, enquanto ethos social originário e heterogêneo  .Nesse sentido, a raiz “sub” não é exatamente o que é inferior, “sub” é o que está por baixo dando sustentação, como o alicerce da casa, como o solo sobre o qual corre o rio, como o caráter que sustenta as ações visíveis de um homem. Mais longe a esse respeito foi Espinosa, que também emprega a raiz “sub” no termo “substância”, porém com outro sentido: nele o sub é onde se encontra a  Potência. Em Espinosa, a Potência também é suburbana (esse "sub" da potência expressa o mesmo que o "pré" das Pré-coisas manoelinas).

Então, para o poeta Paulinho sub-urbano não é  algo inferior à urbanidade da zona sul. Sub-urbano é o que dá sustentação existencial às nossas existências urbanas. A base desse sub não são exatamente valores familiares ou religiosos; a essência desse “sub” são os  valores ético-políticos, valores esses que também se tornam música em Paulinho.

Mais do que no espaço privado das casas, onde reina o “meu”, é no espaço suburbano de vizinhança que se aprende  o afeto pelo comum como prática das comunhões. “Os comparamentos matam a comunhão”, ensina o suburbano Manoel de Barros. Não por acaso , o termo “demos”, de onde vem “democracia”, não designa o centro da pólis, e sim o seu subúrbio , significando também o povo que nele mora.

Viva Paulinho da Viola!

 

“Aprendo com o povo sintaxes tortas.”(Manoel de Barros)






 



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