Manoel de Barros só escrevia à mão
sua poesia, e sempre a lápis. Nunca lapiseira de plástico, sempre lápis de madeira. Curiosamente, “digitar” é
um ato que faz parte da atividade de “bater”, “golpear”. Quem digita, bate com
os dedos nas teclas. Escrever à mão expressa outro tipo de movimento: desenhar.
Quem escreve agencia sua mão com o corpo do lápis, e por intermédio deste é nosso corpo que também
escreve, com seus nervos e fibras, incluindo as do coração. Quem escreve à
mão desenha, parecendo às vezes que o
lápis também dança na ponta de seu grafite, como a bailarina equilibrada na ponta dos pés. Para que na
palavra também se expresse a vida, mais
adequado é o lápis do que a caneta: a
tinta que sai desta é coisa química, mas o grafite que o lápis liberta veio da
imanência da terra, é vida. O cérebro não funciona da mesma maneira quando se
digita e quando se escreve à mão, quando se bate e quando se desenha, quando se
golpeia e quando se dança. Há certa violência em bater-digitar. Talvez essa
seja uma das razões que explique porque
os fascistas gostam tanto de violentar também as teclas e, por
intermédio destas, as ideias, encontrando no meio digital um ampliador de suas
violências físicas e simbólicas. Nada contra o digitar, porém escrever à mão, a
lápis, é ato mais afim ao poema que , como gente, também nasce: “Na ponta do
meu lápis há apenas nascimento”(Manoel de Barros).
( fonte da foto: blog “Os Fazedores”. A foto é uma composição com um desenho feito
pelo próprio Manoel)
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