quarta-feira, 2 de outubro de 2024

arma de instrução em massa

 

Em épocas remotas, um certo ser estranho que mal se distinguia dos primatas pegou o osso de um fêmur e dele fez uma arma. Assim se materializou, pela primeira vez, o poder sob a forma de ameaça de destruição  feita ao semelhante.

Essa mesma mentalidade ameaçadora e destrutiva depois se armou com pau,  flecha,  bala,  pólvora,  canhão ,  mísseis...Até chegar ao grau máximo dessa macabra involução : as guerras mundiais .

A mão daquele bruto que fez do osso uma arma é a mesma  que , hoje, aperta o botão que lança mísseis contra crianças  inocentes.  Essa mão perdeu os pelos, as unhas estão cortadas : ela se tornou a mão do homem branco que se autointitula “civilizado”. Mas impulsionando  essa mão coberta de sangue inocente  está o mesmo impulso cego e  irracional do proto-primata.

Porém  naquela mesma época primeva outros se valiam das mãos para criarem arte na parede das cavernas.  Eram os ancestrais dos artistas e educadores, que faziam da parede das cavernas a ancestral das lousas e telas.

De um lado, as mãos destrutíferas a serviço  da morte; de outro, a mão criadora-artística afirmadora da vida. Ontem e hoje.

Alguns teóricos “utilitaristas”, quase todos estadunidenses,  consideram que a guerra é o preço a ser pago pelo progresso material da humanidade. Eles elencam  vários apetrechos tecnológicos que “evoluíram” a partir da guerra.

Ou seja,  esses teóricos “pragmático-realistas” consideram que a guerra não apenas destrói, ela também construiria tecnologias que , após a guerra, melhoram a vida do homem no planeta. Em geral, esses teóricos consideram que a mão da guerra, e não a mão educadora-artística, seria aquela que , no fim das contas, produziu a “evolução” da humanidade.

Porém, esse raciocínio que associa guerra a progresso se mostra absurdo quando se considera o último fruto dessa árvore da violência: a arma de destruição em massa com poder para aniquilar  o próprio planeta e a humanidade inteira.

Portanto,  é uma ignorância falaciosa  usar os raciocínios para tentar justificar a existência da irracionalidade, sobretudo essa que hoje nos ameaça , seja pela guerra , seja   por um sistema econômico desumano-predador, que são as duas faces da mesma moeda da involução iniciada naquele fêmur ameaçador.

A guerra nos mostra que a evolução tecnológica pode estar a serviço de uma involução que  faz o homem regredir a uma mente semelhante àquela do proto-primata, ainda mais agravada pelo fanatismo religioso messiânico.

A humanidade não começou naquele fêmur levantado em ameaça, ela começou naquelas mãos que transfiguraram a realidade em arte, em linguagem, em cor e forma.

 E foram essas mesmas mãos que , exercendo o cuidado, ampararam o  semelhante ferido com o fêmur quebrado ( certa vez, perguntaram à antropóloga Margaret Mead quando começou a civilização, e ela respondeu dizendo que a primeira evidência de civilização foi um fêmur  fraturado  de 15.000 anos encontrado curado   em um sítio arqueológico). 



(Imagem: “Arma de instrução em massa” cuja munição são livros , do artista argentino Raul Lemesoff)





“Porque a frase, o conceito, o enredo, o verso
E, sem dúvida, sobretudo o verso
É o que pode lançar mundos no mundo.”(Caetano)

 

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