quinta-feira, 8 de dezembro de 2022

a arte de Hermes

 

A  palavra “interpretação” em grego é “hermenêutica”.  No coração dessa palavra está um nome: Hermes, o deus mensageiro. Assim, hermenêutica é: arte de Hermes. Mas qual a relação entre Hermes e a prática da interpretação?

Quando Dioniso , o deus das artes, foi despedaçado pelas Fúrias, divindades do ódio e da vingança, essas imaginaram que haviam derrotado para todo sempre Dioniso, e assim foram embora o Ódio e Vingança imaginando que haviam vencido a Arte.

Mas existia uma arte que as Fúrias ignoravam : a arte de renascer. Isso explica o nome de Dioniso: “aquele que nasceu duas vezes”. Dioniso sempre pode renascer  a partir de sua parte imortal: o coração.

Sabedor disso, Hermes pegou o coração de Dioniso e passou a carregá-lo consigo, de tal maneira que o coração , lugar do Afeto, passou a  ser a mensagem primeira  que dá sentido às outras mensagens feitas de palavras que Hermes carregava para serem lidas e ouvidas.

“2 +2 = 4”, “a capital do Brasil é Brasília”...coisas assim não são mensagens, são informações que a inteligência sozinha pode conhecer.

Mas com as mensagens é diferente, a inteligência sozinha não extrai o sentido delas sem que entre em cena o coração que cada um tem. Na intepretação das mensagens, também é fator decisivo da leitura o afeto que cada um cultiva em seu coração .

Se o coração de alguém é generoso e criativo , interpretará ricamente o sentido de uma mensagem, por mais simples que ela seja, mesmo que não tenha palavras, tal como interpreta Manoel de Barros o canto dos passarinhos fazendo deles poesia que muito nos diz e ensina ( ou ainda Van Gogh , que soube interpretar, pintando, a mensagem dos girassóis...).

Porém  se o coração de alguém é mesquinho, vingativo, autoritário , ressentido... é assim que tal coração lerá as mensagens , não importando se são mensagens da Bíblia ou da Constituição. Gente com o coração assim diz achar na Bíblia mensagens que justificam eles acreditarem que um miliciano pode ser um “Messias”...

E é assim que eles também  interpretam  o Artigo 142 da Constituição Brasileira, encontrando  nesse Artigo  o que o coração autoritário deles quer: que as forças armadas , reencarnando as antigas Fúrias, venham despedaçar a própria democracia...

Contaminada por um coração perverso assim, a inteligência desse tipo de gente  tenta fornecer raciocínios a serviço do ódio e da vingança. Mas quando a inteligência serve a um coração ressentido, seus raciocínios se tornam apenas  sofismas , raciocínios mentirosos,  que só aos tolos enganam...

(este livro de Manoel é apenas uma sugestão de leitura. Manoel diz que o livro nasceu das audições/interpretações que ele fez dos cantos de um sabiá livre  que mora dentro do coração dele)


                                     ( a capa é de Martha Barros, filha do poeta)





 

 

 

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