sexta-feira, 15 de julho de 2022

Espinosa & Manoel: afetos revolucionários

 

Alguns poetas latinos ensinam uma etimologia muito original e rica da palavra “amor”. Essa palavra nasce da união da letra “a” com função privativa ( como em “a-fasia” = “sem fala”) mais a abreviação da palavra “morte” = “mor”. Assim, nesse sentido poético-pensante , “amor” é “não morte”.

“Morte” não apenas no sentido biológico, pois “ódio”, “ignorância”, “necropolítica”... são formas  doentias de  morte também.

Quando nutrimos de fato amor a algo ou alguém , cuidamos, agimos e lutamos pela não morte do que amamos. Amar a democracia , por exemplo, é agir pela não morte da democracia; amar a educação é agir pela não morte da educação.

O amor assim compreendido não é algo apenas  individual ou subjetivo, mas uma força que une as coletividades e as desperta para  a prática política  enquanto ação coletiva para não deixar   morrer a dignidade em nossas vidas.

 Platão é o pai da visão romântica e idealizada que vê o amor como a busca de algo que nos falta. Para os poetas latinos, ao contrário, o amor não é falta, ele é potência já presente em nós agindo  para nos proteger daqueles que negam a vida, a despotencializam ou a querem morta.

Seguindo a lição dos poetas latinos, Espinosa também concebe o amor como potência, e não como falta. Ao contrário do que pensam Platão e os românticos, Espinosa ensina que o amor não é apenas encontro de almas, ele também é a potência  que une alma e corpo, mente e sensibilidade, teoria e prática.

O amor não concerne apenas à alma e corpo individuais, pois também há a alma e o corpo coletivos. Numa democracia, a alma coletiva se potencializa educando-se   nas ideias que despertam nela a compreensão de que ela é, ao mesmo tempo, una e múltipla, singular e plural.

À alma coletiva rica corresponde um corpo social heterogêneo . A educação autêntica é prática para potencializar a alma coletiva como expressão de um corpo social plural-democrático.

Os tiranos, ao contrário, estão sempre querendo entristecer a alma coletiva inoculando nela a superstição e o medo, para assim despotencializar o corpo coletivo reduzindo-o a um rebanho homogêneo , dócil.

E uma das formas que o tirano tem de manter o rebanho coeso é fomentar nele o ódio a tudo aquilo que é diferente, potente, alegre, criador. Medo, ignorância  e ódio são as armas do tirano, ontem e hoje.

Segundo Espinosa, não é odiando a doença que se conquista a saúde: é o amor à saúde que nos faz vencer a doença. Não é o ódio ao tirano que nos dá força para vencê-lo: é o amor à democracia que nos potencializa ante toda forma de tirania. Vingança é ódio, porém indignação ativa é amor à justiça.

Agenciado  a Espinosa, Manoel de Barros nos ensina esta lição que é também clínica, ética, pedagógica ,  política , micro e macrorrevolucionária: “Se a gente não der o amor, ele apodrece dentro de nós”.

 

( este livro é apenas uma sugestão)



 

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