sexta-feira, 18 de março de 2022

só a arte salva

 

O filósofo Heidegger dizia que  uma coisa é  “diminuir a distância” , outra  bem diferente é “criar proximidade”. A tecnologia diminui as distâncias, sem dúvida. Mas uma coisa é diminuir a distância entre seres no espaço, outra bem diferente é criar proximidade com o sentido daquilo que nos é mais essencial e indispensável.  Esse sentido nem sempre está dado, às vezes ele precisa ser descoberto ou mesmo criado.

Enquanto instrumento técnico, o telescópio diminui a distância entre a lua e nossos olhos, isso é fato. Porém, quando lemos num poema  a lua em versos, o poeta não põe a lua perto de nós no espaço, porém ele a põe  tão próximo que, empoemando-nos, experimentamos seu sentido também em nós, no "devir-lunar" que nos tornamos.

 E quando a lua está mais viva e cheia de luz , como na potente lua cheia de hoje  , o devir-lunar pode se tornar ainda mais vivo e intenso ,  e assim fazer   recuar a noite : a de fora e , quem sabe, a de dentro.

Esses momentos de isolamento social nos colocaram longe espacialmente, porém nunca estaremos sozinhos existencial e politicamente se mantivermos viva e intensificarmos a  proximidade com as ideias e valores  que nos fazem seres pensantes e solidários.  Mantendo-nos próximos dessas ideias, estaremos próximos de nós mesmos.

A arte serve para nos ensinar a aprendermos criar proximidade com tudo aquilo que,  para existir e se tornar real, precisa ser criado, pessoal ou coletivamente. A ideia de liberdade, por exemplo, só existe ser for  produzida em um devir-libertário.

No céu de hoje à noite, a lua cheia surgirá plena  para quem  levantar a cabeça e a encontrar. Ela durará um tempo, depois passará, como tudo.

Mas no poema ela estará salva e pode ser sempre reencontrada  : sempre nova e a brilhar, para que algo em nós  a brilhar a gente também  possa encontrar , apesar dessa noite espessa.

 

 

 “Só a arte salva.” (Deleuze)











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